Depois da noitada de ontem, acordei incrivelmente tarde. A manhã foi uma nulidade. Apesar de não sofrer normalmente da “popular” ressaca, há misturas “letais”. Nove horas de sono depois o mundo ainda gira em meu redor. A cabeça estala, a boca está seca e a sede é insaciável. Não se passa nada de assinalável até à partida. Tenho bilhete para o comboio, mas a sua utilização é livre dentro de cada dia. Se perder aquela composição, posso seguir na próxima sem preocupações. Na realidade é por um fio. Chegamos à estação, que se encontra a 200 metros do apartamento, cinco minutos antes da partida. Há que mostrar o passaporte a um agente que me deixa passar por uma sala… à saída, outro, pede-me de novo o passaporte. Pergunto-lhe: “- Again?!”. Ao que responde com ar paciente e enfatuado. “-Yes, austrian polizei”. Ah! O controle de saída e entrada é todo feito na estação de partida. Isso confunde-me mas não penso muito mais sobre o assunto. Subo para a estação e fico extasiado. As carruagens têm dois andares, e, claro, subo para a de cima. Quase imediatamente o comboio põe-se em andamento. É imperceptível. Completamente insonorizado. Cadeiras ergonómicas. Vai vazio. Só vejo uma pessoa para além de mim. Penso que naquelas condições era capaz de ir de comboio até à Argentina. E que pena que a viagem só vai demorar 50 minutos. Gostava de dispôr de mais tempo para me retemperar. Ponho tudo em dia: arrumo as bolsas da mochila, faço contas, respondo a alguns eMails… e de repente, já estou a chegar a Viena. A paisagem não me chamou a atenção. O dia está a ficar gradualmente mais cinzento e isso reflecte-se nos campos, que de resto são monótonos. Está tudo cultivado. A única alegria daquele cenário aborrecido são dois veados que saqueiam uma das culturas. Olham para o comboio com ar indiferente e prosseguem o repasto.

Desde o momento em que entro no comboio, parece que sou escoltado por um anjo da guarda: tudo corre bem. Depois daquela deliciosa viagem, saio da estação e vejo imediatamente passar em frente do meu nariz o eléctrico D. É este que tenho que apanhar. Atravesso a rua a correr, o que não é simples com tanto peso de bagagem e entro no tal D. Vou vendo as ruas. Viena parece um museu gigante: a cada esquina ergue-se um edíficio ainda mais majestoso do que o anterior. Parecem ser inesgotáveis. As pessoas são diferentes, sobretudo as mulheres – para dizer a verdade nem reparei nos homens – na Eslováquia arranjam-se primorosamente e são extremamente sexy, enquanto que na Áustria não chamam a atenção de todo. 50 km de distância, um mar cultural de permeio. Vou controlando as paragens do eléctrico. É simples. Saio onde deveria sair e apanho o próximo eléctrico poucos minutos depois. De novo, acerto na paragem certa, e ando até à morada fornecida. Como tudo correu tão bem, chego mais de meia hora adiantado e entretenho-me a observar o restaurante oriental que fica mesmo em frente do edíficio.

 O Florian chega, e de novo há aquele click de entendimento. Adoro o apartamento. É pequeno, um T0. Mas o estilo de espaço é feito à minha medida. Chamar-lhe-ia um ambiente intelectual, informal sem ser desarrumado. Faz sentido:o Flo é investigador na universidade. Biomolecular ou qualquer coisa assim. Ali, tudo me agrada. Tenho já à mão um cabo de rede para ligar o portátil. Ouve-se música portuguesa. É que ele tem uma ligação forte com o nosso país. Teve uma namorada no Lumiar, vê o Benfica, lê na nossa língua. Ficamos por aqui à conversa, a partilhar música e a Internet, até que vamos jantar, aqui mesmo abaixo, ao oriental. Excelente! Por €8 a comida é à descrição, e que saborosa que é. Ele repete três vezes; eu, encho o prato por duas vezes. E depois de um longo dia, enrolo-me no “Manuelito” – o nome que ele deu ao sofá que comprou para os couchsurfers, e durmo.

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