O Dan tirou o dia para nos fazer companhia, até já calculando, como ele próprio admitiu, que a noite anterior iria ser longa (como foi… disseram-me que passámos por uns oito locais, apesar da minha memória se ter apagado após o terceiro). O acordar, claro, foi tardio, e aproveitei para tirar umas fotografias à cidade a partir das nossas varandas.

 

 

Pequeno-almoço tomado, fomos até Mtshketa, a antiga capital da Georgia, até ao século VI, quando o rei Dachi I, seguindo os desejos do seu pai, se transferiu para Tibilissi, um local estrategicamente mais adequado. Mesmo assim, até ao final da monarquia georgiana, já no século XIX, Mtshketa continou a ser o cenário do cerimonial de coroação e é hoje considerada o centro espiritual da nação.

A pequena cidade, de cerca de 20 mil habitantes, encontra-se a 20 km a norte da actual capital. As ligações rodoviárias são boas, segundo os padrões locais, mas para apanharmos a espécie de auto-estrada que liga Tibilissi a Mtshketa há que antes enfrentar o trânsito caótico da grande urbe. Os georgianos conduzem mesmo mal. Nunca estive em países com verdadeira má fama de volante, especialmente lá para a Ásia, mas ler os comentários dos turistas sobre a condução em Malta ou na Síria, faz sorrir… essas pessoas, se pusessem um pé nas ruas de Tibilissi, teriam certamente um colapso cardíaco. O Dan explica-nos que não se sobressalta muito: no caso de um precalço ao volante, só terá que ligar à embaixada, que em poucos minutos colocará no local uma equipa especializada na resolução desse tipo de problemas e um carro de subtituição com que poderá seguir imediatamente viagem. Mas isso é ele. Eu, fico com a certeza que nunca arriscaria conduzir, especialmente um carro de aluguer, nas estradas georgianas.

 


Antes de Mtshketa, um desvio levou-nos até ao mosteiro de Jvari (mosteiro da Cruz), que se ergue, imponente, no alto de um monte, bem vísivel a partir da auto-estrada. As vistas que se aprecial de lá de cima são impressionantes: ao longe, Tibilissi; ali bem mais perto, quase aos nossos pés, Mtshketa, e o rio, curvilineo; pelo meio, a via que segue para norte, e que os russos, em 2008, utilizaram para se aproximar ameacadoramente de Tibilissi, antes de iniciarem a retirada voluntária; e em redor, o campo, os rebanhos de ovelhas, feitos pequenos pontos brancos que se destacam sobre o pano verde.

 

 

No mosteiro, famílias georgianas vêm prestar a sua visita respeitosa, entre as quais se mistura um casal de turistas russos, muito louros, muito diferentes daquelas gentes com quem partilham uma religião comum. O dia está magnífico, com um céu azul profundo. Ficamos por ali a apreciar todo o ambiente e a conversar sobre a Geórgia e a sua história. O caminho que levará até ao vale é pictoresco, e o Dan aventura-se por trilhos de terra batida, simplesmente pelo prazer de explorar, mas sem grandes resultados prácticos. Todos eles acabam abruptamente sem trazer nada de novo. Vimos uma vaca solitária que pasta num enorme campo verde, e, num outro, junto às águas de uma albufeira, um casal goza o sol quente sobre uma manta, lá longe, quase dois meros pontinhos na paisagem natural.

 

 

Ainda antes de parquearmos o carro junto à catedral de Svetishkoveli, no centro de Mtshketa, descobrimos um bastião militar, no lado oposto do vale. Há grandes sinais proibindo a entrada, mas já somos rapazinhos crescidos e decidimos assumir os riscos de derrocada que a posição periclitante de alguns muros deixam bem claros. De novo, grandes vistas, e, mesmo em frente, ainda mais alto, o mosteiro que ainda há pouco deixámos para trás. Brincamos uns instantes com uma revista de sociedade que ali encontramos abandonada, e com o impressionante alfabeto georgiano, um dos 14 existentes no mundo.

 

 

A catedral de Svetishkoveli é talvez o edíficio religioso mais notável do país. Teria gostado de deambular por Mtshketa, mas como vinhamos com o Dan não foi possível. Apenas visitámos a catedral, o que não me inspirou muito. Igrejas e afins não são mesmo o meu género. Mas achei piada a observar os crentes e visitantes que por ali andavam, especialmente uma senhora  evidentemente analfabeta que ditava a uma jovem um texto qualquer. Comprei um fio com uma cruz ortodoxa, que uso de tempos a tempos, como simples adorno. Divertimo-nos com um velhote que cantava acompanhado com uma espécie de bandolim. E depois, era hora de regressar.

 



 

Antes de recolhermos a casa para um duche e posterior saída para a noite de Tibilissi, o Dan fez questão de nos mostrar um dos seus pousos favoritos. Numa zona recatada da cidade, nas colinas envolventes, uma área de lazer, que, mesmo ao final da tarde, chamava ainda muitos locais. Ali há uma esplanada, um palco dentro de água e um lago que oferece a ilusão de praia, especialmente nos dias mais quentes. Sentámo-nos a relaxar, depois das voltas do dia, bebericando coca-cola. Ao lado, um grupo de jovens, muito jovens, perdia-se em coquetismos com os meus jovens, não tão jovens, amigos. Uma velhota varria, numa tarefa sem fim, o chão exterior do espaço. É a última memória que guardo deste 19 de Maio.





 

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