Esta viagem, como algumas outras, iniciou-se a valer na estação de comboios de Loulé. Ali sentado, na pedra do chão, pensava para com os meus botões que agora é que ia ser a doer. Ficava para trás a zona de conforto, já não não eram apenas leituras e planos, estudos e informação. Estava a começar a descoberta de Cuba. Dentro de uns minutos entraria na composição e estaria lançada a “fiesta”.

Lá apareceu, o Intercidades de depois do almoço, que é o que quase sempre apanho. Em direcção a Lisboa, num trajecto calmo, que deu para descontrair um pouco, entre as correrias da partida e as provações que certamente ai viriam. Da Gare do Oriente, Metro para o aeroporto. A Portela, sempre com aquela falta de qualidade que me aborrece… o passageiro sai do metro e não tem informação. De que terminal parte o voo Easyjet para Londres Gatwick ninguém poderá saber. É preciso umas voltas pelo terminal até encontrar o monitor com as partidas. É do outro terminal. Ao menos sei onde é o autocarro interno que vou precisar.

Tudo normal. Passagem pelo controle de segurança. Bons profissionais, boa disposição, grande atitude. No portão de embarque. A entrar para o avião. No ar. Adeus Portugal, até breve. Vemo-nos depois do Natal, o primeiro de cinquenta anos passado longe da minha terra.

Em Gatwick, a dança de sempre, em busca do melhor lugar para passar a noite, dificultada por uma chegada já tardia. Os melhores lugares, de bancos almofadados corridos já estavam tomados. Encontrou-se o conforto possível, reforçado por uma ficha de electricidade que permitiria a leitura ou visualização de filmes sem limites. Internet: em Gatwick existem 45 minutos de livre acesso. Que podem ser renovados se se tiver mais do que um dispositivo (quem sabe não se poderá iludir o sistema… não precisei de experimentar).

A manhã londrina acordou cinzenta e fria. Tudo normal, portanto. Lá fomos, pelos quilómetros de corredores até à porta de embarque, depois de usarmos o comboiozinho autónomo que liga os dois terminais. A organização põe a pata na poça. Saimos das salas de espera assim que foi anunciado o gate mas a meio do caminho já anunciam que a porta de embarque está a encerrar. Há gente a correr. Estranhamente não há verificação de passaportes. Não entendo. Deveria haver verificação de passaportes para abandonar o Reino Unido, a Europa… mas não… nada disso.

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É o primeiro voo num Boeing 747. E o primeiro com a Virgin Atlantic. Sobre a companhia só tenho coisas positivas a dizer. Desde o funcionamento do website, o conforto das cadeiras, o espaço. Mas como planeio escrever um artigo sobre tudo isto, passo agora à frente. Mais importante que tudo o resto, no capítulo das minhas primeiras vezes, será um voo de longa duração. Dez horas. O anterior record era de sete horas, Lisboa – São Tomé. E correu muito bem. Considero-me curado da fobia projectada dos intercontinentais. Pronto para mais, sem problemas. O sistema de entretenimento de bordo ajuda, mas no regresso nem o usei e esteve-se igualmente bem (também é verdade que para cá foram apenas oito horas de viagem).

Vi dois filmes, li. Acho que não dormitei sequer. É estranho, voar para Ocidente, porque o dia corre à nossa frente; a noite parece não se querer deixar apanhar e o sol é intenso durante as dez horas. Apenas à chegada as coisas do tempo parecem voltar à normalidade e a luz começa a escassear. Creio que foram duas horas até sairmos para a área pública do terminal. Há uma vistoria de bagagem à chegada, mas ligeiro, como costuma ser feito o controle de segurança nas partidas. Não trouxe o meu bem-amado GPS porque Cuba é o único país do mundo onde não é permitida a entrada deste tipo de dispositivos, mas poderia tê-lo incluido na bagagem porque passaria sem problemas. Depois a verificação de passaportes. Está tudo em ordem mas demora tempo. Há uma longa fila.

Lá está o tipo que nos vem esperar, enviado pela “casa particular” onde vamos ficar nas primeiras noites em Cuba. Serão 25 CUC pelo transporte. Cerca de 21 Eur. O carro é um táxi normal, novo. Vamos passando por amplas vias a caminho da cidade. Há uma poluição enorme, como nunca senti. É a primeira marca de Havana. Isso e um sidecar que roda à nossa frente. Achamos divertido, sem fazer ideia de que muitos mais veriamos nas duas semanas seguintes. Cuba é o país dos sidecars.

Passamos perto da Praça da Revolução, há locais que reconheço só pelas leituras que fiz antes de vir. Finalmente o mar. Estamos no malecon, que é a designação para estrada marginal. Já não estaremos longe de casa porque é precisamente nesta avenida. E chegamos.

Jesus tem sessenta anos e faz anos no mesmo dia que eu. Recebe-nos, mostra-nos o quarto e a casa. Excede as expectactivas. Estou excitado com tudo isto, de novo nos trópicos, depois de São Tomé, mas agora com um perfume hispânico que é novo para mim. Depois de me instalar, vou para a varanda, ver o mar ali mesmo em frente. O Jesus junta-se-me e ficamos um bocado à conversa.

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Diz-me que a casa – de seu nome comercial Casa Blanca – foi construída em 1902. Apesar da remodelação a que foi sujeita recentemente muitos dos elementos são os originais. Como as colunas metálicas, os espelhos, o chão. Esta casa foi paixão à primeira vista, logo desde que vi as imagens online. Depois, seguiu-se a concretização deste amor, no dia em que cheguei. E a despedida, dura, muitos dias mais tarde. Por isso não se espante o leitor pelas muitas fotos que aqui publicarei. Para já três, mas serão mais, em futuros artigos.

Mas tenho que dormir. O fuso horário. Em Portugal serão mais cinco horas. E como se imagina depois de dois dias de viagem estou um bocado cansado. Amanhã será o primeiro dia a valer. Quero acordar assim que o sol nascer. Não, antes. Quando o sol nascer já quero estar na rua. Jesus diz-me que isso sucede às sete. Então acordarei às seis e meia.

Na cama, ouço os carros que passam no malécon. É ruidoso, mas vale a pena. E depois, os tampões de ouvido isolam-me do mundo e adormeço.

6 COMENTÁRIOS

  1. Boa estada, Ricardo.
    Acabo de ver as notícias na SIC Notícias e um avião da Virgin levantou voo e voltou, para Gatwiik, ia a caminho de Las Vegas, por problemas no trem de aterragem!
    Só a título informativo e a coincidência da companhia aérea!
    Abraço

  2. Que sorte tive. Mesmo assim seria um pequeno nada comparado com o que sucedeu ontem com o voo da Air Asia, uma companhia que tão boa impressão me deixou e que certamente voltarei a usar no futuro.

    • Boa tarde,
      É verdade…mas, como se costuma dizer “por morrer uma andorinha, não se acaba a Primavera!
      Pior sorte, tiveram os passageiros da Air Asia…e os do Ferry-boat grego!
      Já estive em Cuba, mais propriamente em Varadero, 2 semanas, adorei, pois também, visitei Havana e senti-me transportada a um outro mundo, uma outra época!
      Aos pouco irá observando…que o que fazia o grande cartaz turístico cubano, os carros antigos de 195…
      já estão em vias de extinção, servindo, só para turista ver e usar, como táxi.
      Adorei a parte antiga, a reconstrução dos edifícios e a praça dos alfarrabistas, e que tem um piso feito de madeira, para não acordar as pessoas, durante a noite, quando por lá se andava a cavalo
      Aguardo os seus relatos, com expectativa!
      Um abraço

  3. Olá Ricardo, gostava de lhe perguntar se contratou algum seguro de saúde para a sua estadia em cuba? Quando comprei os bilhetes pela net indicavam isto:

    “Recorde que SÓ PODERÁ VIAJAR PARA CUBA SE TIVER UMA APÓLICE DE SEGURO que cubra eventuais despesas médicas que possam ocorrer durante a sua estadia na ilha. A apólice poderá ser adquirida numa companhia de seguros estrangeira que seja reconhecida em Cuba ou numa companhia de seguros cubana. Isto é OBRIGATÓRIO PARA TODOS OS VISITANTES (sejam estrangeiros ou cubanos residentes no estrangeiro), com excepção para diplomatas e representantes de organizações internacionais acreditadas.”

    Outro tema que tambem gostava de lhe perguntar é se o visto é mesmo preciso comprar no restelo? é que já me disseram que se podia comprar la no aeroporto. Sabe algo? Obrigada.

    ps. Os relatos desta sua viagem têm sido o nosso livro de mesa de cabeceira, uma inspiração para a nossa Lua de mel ao estilo road trip em Cuba! =) Obrigada.

    • Olá Cátia,

      1) Seguro. Toda a informação que encontrei quando fiz os trabalhos de casa apontava nesse sentido; contudo, fiz um seguro não pela obrigatoriedade mas pela precaridade de muitas situações em Cuba. Não sou uma pessoa muito dada a seguros, mas depois de ter feito um para uma viagem pela Indochina que teve uma utilização miraculosa, decidi passar a fazer para destinos fora do nosso mundo “desenvolvido”. Não o faço junto das empresas internacionais especializadas, bastante mais caras, mas com uma tradicional empresa de cá, não me recordo se a Tranquilidade ou a Fidelidade, através de um mediador. O valor foi uns 70 Eur, para duas pessoas, para duas semanas em Cuba, incluindo saúde e roubo. De qualquer modo, ninguém pediu para ver nada à entrada no país, que de resto foi uma entrada muito suave e sem problemas, mais do que em muitos países ditos “normais”, como o Reino Unido.

      2) Há relatos da possibiliade de adquirir à chegada, mas eu é que não arriscava. A própria companhia aérea em que fui – a Virgin Atlantic – vendia os vistos junto aos balcões de check-in, com a sua devida e nada baixa comissão. Mas vale mesmo a pena ir à embaixada em Lisboa. Simples, rápido e barato.

      3) Se vocês usam ebooks posso mandar umas coisitas por e-mail… ?

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