Livros: Slow Train to Guantánamo

books-guantanamo Peter Millar notabilizou-se enquanto jornalista pelas suas crónicas a partir do Leste da Europa, onde viveu e trabalhou até à queda do Muro de Berlim. Apenas nos últimos anos surgiram livros deste autor, todos eles prometedores, tendo em conta a qualidade revelade neste Slow Train to Guantánamo.

Estamos perante um genuíno exemplo de literatura de viagens. O objectivo é desde logo traçado, com o autor a propor-se a chegar a Guantánamo, partindo de Havana. Pode não parecer muito ambicioso, sobretudo numa altura em que viajantes competem pelo privilégio de serem publicados, levantando cada vez mais a fasquia daquilo a que se propõem fazer e relatar. Mas Peter Millar já não vai para novo, e aquilo que lhe falta em ousadia e disposição para a aventura é largamente compensado por uma capacidade incrível de contar a história da sua visita a Cuba.

O livro foi publicado em 2012. E a Cuba de que Peter nos fala é a actual. Não a de Fidel, na sua linha pura e dura, mas o país que é hoje, na expectativa da liberalização eminente, da queda de um muro imaginário… não será o de Berlim, mas o do mar das Caraibas, com a Flórida ali a espreitar. Será um manual essencial para todos os que estão decididos a visitar este interessante moribundo que é o regime castrista, agora continuado pelo mano Raul, mais novo que Fidel, mas mesmo assim um dinossauro de 82 anos.

Nas páginas deste livro o leitor será levado através das vidas de cubanos comuns, que o autor observa com olhar acutilante, interagindo aqui e acolá com alguns figurões memoráveis. São capítulos ilustrados a palavras, com um impacto gráfico notável. O que Peter vê, é como se o vissemos com os nossos próprios olhos. Tal é o poder da palavra deste jornalista britânico. E depois, há a capacidade de contar uma estória, aquele jeito que só alguns conseguem ter, de agarrar a atenção de quem começa a seguir-lhes a narrativa, dominando o ritmo, criando um vício no leitor que não consegue escapar das páginas do livro, virando sempre mais uma, e outra, e outra.

Um dos méritos da obra será conseguir ser tudo ao mesmo tempo: um guia de viagens, um diário pessoal, uma crónica política, uma fonte de ideias para futuros visitantes (convém é não esperar demasiado para dar um salto até à ilha dos Castro… se for antes da transformação do país numa espécie de Porto Rico, melhor),  um registo de um tempo que se encontra em vias de extinção. É mesmo um “must” para qualquer pessoa interessada em Cuba, mas sobretudo para quem esteja a preparar uma expedição a este país caribenho.

Pela negativa, apenas detalhes. Peter não devia comentar expressões e palavras castelhanas, porque não sabe do que fala. E talvez devesse ter sido mais cuidadoso nas passagens em que o texto envolve cidadãos cubanos com alguma expressão crítica. Os pormenores são excessivos e o livro poderá perfeitamente ser lido pelas pessoas erradas.

Em suma, talvez o melhor livro de viagens que me passou pelas mãos, ou pelo menos até onde a memória alcança. Excelente, excelente.

Nota: Creio que o livro não se encontra disponível no mercado português.