Tudo se configurava para um grande dia. O tempo estava excelente, céu azul, vento fraco, temperatura amena. E o programa era entusiasmante: trepar ao topo de um dos milhentos vulcões de El Salvador. Só que este tipo de passeio no interior do Parque Nacional Los Volcanes não pode ser efectuado a solo. É preciso o visitante enquadrar-se num tour. Tudo bem, não foi complicado: apanhar cedinho em Santa Ana o autocarro para o parque, esperar pela hora da partida da tour e apreciar a envolvência.

O preço é simbólico. Tudo somado dá em 6 USD. Incluindo a escolta policial. Isso mesmo! Escolta policial. Parece que houve uns incidentes por aqui. Uns mânfios que vinham de longe para fazer espera aos desprevenidos turistas e a coisa depois não corria bem. Então estabeleceu-se um piquete da polícia de turismo que está em permanência aqui instalado e cujo pessoal acompanha os passeios.

Neste dia o senhor agente atrasou a saída. Uma reunião em Santa Ana fê-lo chegar meia hora baquerodepois e sem ele ninguém pode sair dali. E lá fomos. Andámos um pouco e depois fez-se “alto”. O agente tinha um briefing para nos dar. Pessoas com problemas era melhor desistirem. Articulações fracas, corações doentes, excesso de peso. Etc, etc. Ninguém se acusou e a expedição prosseguiu.

Foi logo a seguir que comecei a falar com ele, ou, na realidade, ele começou a falar comigo. E o que fez com que a conversa continuasse para além da mera apresentação formal foi eu ter-lhe dito que tinha sido oficial aqui nas nossas forças armadas. Pronto, ficou conquistado. Mostrou-me orgulhoso a sua arma, uma Galil, de fabrico israelita, e depois a pistola que trazia à cintura. Fomos falando de armas, de operações, de coisas, digamos técnicas.

Achei-lhe piada, não só pelo aparato que trazia ao grupo, como pelo perfil deslocado: com aquela postura imaginá-lo-ia num qualquer grupo de operações especiais, não a pastorear turistas chatos. Atlético, militar até ao tutano, pronto para tudo. O tipo de gajo que queremos a cobrir-nos no caso de alguma coisa dar para o torto.

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Durante o restante passeio não falámos muito mais. Limitei-me a observar. Na fase final da ascensão ao pico, enquanto toda a gente suava as estopinhas para vencer a inclinação do trilho, ele simplesmente ia a direito, tal cabra montanhesa, esperando pelo grupo um pouco mais acima, fresco que nem uma alface. E já nem era um rapaz novo.

Depois descemos, quase toda a gente partiu em carros particulares mas eu fiquei, à espera do autocarro para Santa Ana. Fui dar uma volta e quando regressei estava o agente Baquero a almoçar lá na cafetaria do parque. Perguntei se me podia sentar e ficámos à conversa. Perguntei-lhe que tal era ser polícia em El Salvador, se recebia bem. Cerca de 600 USD. O que considerando o custo das coisas não será muito diferente do que ganham os nossos. Não sei como é que um tipo com aquele aspecto robusto e operacional veio aqui parar. Os polícias aqui colocados têm uma casita onde vivem uma semana consecutiva e depois têm uma folga de uma semana. Um bocado duro para os que como o meu amigo Baquero são casados e têm filhos. No caso, uma filha, com este pai babado. A miúda apresta-se a ir para a universidade. Chama-se Cristina. Fala não sei quantas línguas. Mas ele não. Certamente não se aproximou da universidade e apesar de estar na unidade de polícia turística fala apenas espanhol.

Falámos das minhas viagens, que despertaram grande curiosidade. Entretanto ia despachado o almoço, com grande voracidade, Galil em cima da mesa. Gostava que a conversa se prolongasse – tinha ainda muitas curiosidades sobre os aspectos operacionais da polícia em El Salvador – mas ele apontou-me o autocarro que chegava. Desconfio que também não veria com maus olhos uma companhia que quebrasse a rotina da sua semana de escala.

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