Vou chamar-lhe Manolo e, para manter o seu anonimato (a foto acima é do autor do artigo deitando abaixo uma garrafa de vinho com a pessoa de que aqui se fala), dizer apenas que o encontrei numa pequena aldeia em África, longe de tudo, onde ele me contou a sua estória. Na realidade, Manolo foi a visão mais inusitada. Chamavam-lhe o “Branco da Aldeia”. E a sua história é merecedora de ser contada.

Há cerca de três anos era um homem de sucesso. Proprietário de uma empresa de algumas dimensões, tinha um casamento estável e um filho de uns dez anos. Tudo parecia correr bem na sua vida, mas os eventos que seguiram trataram de alterar o cenário: numa rápida sucessão, a sua empresa começou a dar prejuízo, tudo corria mal, as vendas desciam, as despesas aumentavam, e de repente a falência parecia ser a única saída para a situação. E teria sido, mas assim as coisas seriam demasiado fáceis. Vendo isto, o sócio de Manolo decidiu apimentar um pouco o cenário, fugindo para parte incerta depois de desviar os parcos fundos que ainda existiam.

Portanto, Manolo foi deixado com a batata quente numa mão. Ainda pensava no que fazer a seguir quando lhe aterrou na outra mão uma verdadeira brasa: a mulher exigia-lhe o divórcio deixando desde logo claro que iria fazer tudo o que pudesse para dificultar o acesso do pai ao filho. Mas este homem não era pessoa para desistir. Não. Tinha ainda uma colecção de bens com algum valor que vendeu. Objectivo: recomeçar a vida num outro local, onde pudesse encontrar a felicidade e a tranquilidade. Este recanto de África pareceu-lhe adequado.

Ali investiu tudo num restaurante. Mas enganou-se, tragicamente. Lavrou um contracto de arrendamento anual com uma renda que contava suportar com os ganhos. Só que os ganhos não vieram, pelo menos na escala necessária, e o senhorio, que não era homem para brincadeiras, com um contracto na mão e a falta de pagamento na outra, apresentou-se certo dia com uns quantos amigos e fez o seguinte, mais ou menos por ordem: sovou o nosso amigo Manolo, retirou os bens com algum valor das instalações e destruiu o resto.

Depois, há aquela série de pequenos detalhes que confirmam que um tipo está marcado pela maré negra do azar: o barco onde segue vira-se. Aconteceu um par de vezes em cinquenta anos. Está na praia e um mini-tsunami não o mata mas leva-lhe tudo o que ainda lhe resta que não pode ser subsituido: telemóvel, óculos, um livro, documentos.

E pronto, aqui o temos, uma fracção de tempo depois do dia em que era um empresário de sucesso com uma bonita família, algures no coração de África, sem absolutamente nada. Uma história inspiradora para a maioria dos que pensam ter uma vida complicada.

Foi assim que o encontrei. Naquela aldeia. Manolo vivia sem o factor “dinheiro” na sua vida. Ajudava os homens nas suas fainas, punha ao seu serviço alguns conhecimentos que tinha na área tecnológica, e, por sua vez, eles retribuiam com oferendas em géneros. Dava uma mãozinha às mulheres, auxiliava no que podia, e recebia sempre uma justa recompensa pelos seus esforços. Para viver tinha um tecto, uma casa europeia degradada que lhe era facilitada porque os locais acreditavam que estava assombrada. Dizia viver feliz. Talvez o fosse. Talvez conseguisse retirar da fé religiosa que havia descoberto em si, algures ao longo deste díficil percurso, a energia necessária para prosseguir.

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