15 de Fevereiro de 2025

Depois de um pequeno-almoço à beira de estrada voltamos a Tarim. Primeira paragem na mesquita de Al-Haddad. Só permitem a entrada a muçulmanos. Esta característica foi quase constante no Yemen num contraste com o que se práctica em quase todos os países islâmicos, onde toda a gente é bem vinda aos locais de culto.

Damos uma vista de olhos a uma outra mesquita, de seu nome Almihdhar, bem no centro de Tarim, que se distingue com um recorde mundial: o minarete feito de adobe mais alto do mundo.

Uma fortaleza histórica num promontório à beira da estrada

Ao almoço, um detalhe: o nosso bem-amado Bandar, condutor muito profissional, perdeu o dinheiro… o dinheiro todo, da empresa, para apoiar a viagem. De bem trigueiro ficou branco num ápice, apenas para recuperar as cores quando se apercebeu que o Brian, o nosso companheiro germano-dinamarquês vinha atrás e encontrou o maço no chão.

Refeição que como quase todas preferi tomar com o pessoal no tapete no chão, usando os talheres que os deuses criadores nos deram. Como se faz por estas paragens, comer com os dedos da mão direita.

Feijão com ovos. Delicioso!

Depois da barrigada um passeio a pé pelas partes antigas da cidade sob o calor inclemente. Que dizer, Yemen puro. É isto. As ruas empoeiradas, as motas e motorizadas que passam, com um, dois, três ou quatro passageiros. Protegem-se como podem do sol. Passa uma a zumbir. Leva três homens… e uma sombrinha de praia montada, bem aberta.

As pessoas olham-nos com interesse. Outras demonstram uma indiferença que, pressinto, não é genuína. Hostilidade? Acho que nunca. A pedido de alguns membros do grupo o Jamal encontrou uma loja de artigos desportivos. Queria-se comprar camisolas da equipa nacional do Yemen, mas acabaram por se fazer outras compras. Encontrei o equipamento das quinas, a companheira croata avistou a camisola axadrezada vermelha e branca.

Uma mesquita só para muçulmanos

Regressamos a Seyun para visitar o seu centro histórico. Para lá chegar há que atravessar um pórtico, a única entrada para a cidade muralhada. É, também, uma entrada para as Mil e Uma Noites. É a Arábia das histórias, do imaginário da minha geração. A cidade relativamente moderna fica à porta. Tirando os veículos motorizados, a cablagem e a iluminação eléctrica, poderíamos estar na Seiyun do século XIX, talvez ainda mais para trás no tempo.

As vielas perpendiculares à rua principal sobem montanha acima, com piso irregular, e em cada uma vê-se alguém que sobe ou desce, crianças que brincam, residentes na sua vida quotidiana. É um passeio agradável, apesar do omnipresente calor, e muito interessante.

Há cabras que vagueiam, edifícios decadentes, em ruínas. É o problema da construção em adobe. A falta de manutenção atempada resulta nisto. Há recantos que parecem cenários de um filme de guerra.

Regressamos aos carros. Segue-se uma paragem num ponto alto. Ali está um mausoleu, residência final de uma figura essencial para o Sufismo. Há outros visitantes, uma extensa família yemenita.

O Jamal pergunta ao chefe de família se as mulheres estariam dispostas a tirar fotos com os elementos femininos do nosso grupo. Estão e segue-se uma animada sessão fotográfica.

Depois, a caminho de Shibam, talvez o prato principal de toda a viagem, pelo menos na teoria. Trata-se de um local classificado como Património Mundial da Humanidade pela UNESCO desde 1982. A pequena cidade tem edifícios de adobe datados do século XVI, alguns deles com sete andares. Uma proeza arquitectónica para a sua época que lhe valeu o epíteto de Manhattan do Deserto.

Deixamos as viaturas à entrada e internamo-nos nas ruas. Já é tarde, a visita não poderá ser longa. Seguimos em cortejo, com algum espaço entre nós, numa liberdade controlada.

Há vida na cidade, mas não muita. Um grupo de crianças brinca numa praceta e fica a observar-nos com curiosidade quando aparecemos. Não seremos uma novidade absoluta, Shibam é a principal atracção do país, mas mesmo assim as atenções focam-se em nós.

Para dizer a verdade este é um daqueles casos em que o local é mais interessante visto a uma certa distância do que no seu interior. As ruas parecem todas iguais e depressa a visita se torna monótona.

Um vendedor persistente tenta fazer negócio. Promove fotografias com os seus produtos, tenta atrair-nos para o interior da sua loja, mas o Jamal vai-lhe dizendo que estamos curtos de tempo. No dia seguinte voltaremos com mais calma. O que não é totalmente mentira. Já nos tinha dito que se quiséssemos podíamos regressar já que passaríamos naquela estrada a caminho do destino para passar a noite.

Já regressávamos aos carros quando vejo um grupo de velhotes a beber chá numa praça, sentados numa espécie de café de rua, como um centro social ao ar livre. Pergunta ao nosso guia se dá para pararmos para tomar também um chá. Que sim. E assim, espontaneamente, se fez um dos momentos altos da viagem.

Os senhores, muito simpáticos e acolhedores, moveram-se para fazer espaço para o nosso grupo, insistiram em ceder cadeiras a quem precisava e ali ficámos a bebericar o quente líquido e a viver o momento.

Na hora de pagar a nossa croata declarou-se ofertante e disseram-lhe uma quantia equivalente a 0,75 Euros, ao que ela multiplicou rapidamente por sete e pagou… só que os 0,75 Euros não era por chá mas sim o total para as sete bebidas. Muito bom.

Agora restava conduzir para um ponto alto, do outro lado da estrada principal, para ver o pôr-de-sol e contemplar Shibam à distância, numa perspectiva global.

Foi um bom momento. Só nós, lá em cima, com um vento refrescante que cortava o calor do dia, aquelas torres quase medievais a dourarem-se à medida que o astro rei descia sobre o seu leito.

Para além da cidadela, mais antiga, o resto de Shibam é também caracterizada por aquele tipo de construção. Dali, quem não saiba não conseguirá distinguir a velha cidade dos bairros novos.

Foi o fim do dia, seguiu-se o regresso a Seiyun para a última noite passada na capital da região. Pelo menos por agora.

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