O senhor Jerónimo é um notável são tomense. Conheci-o na viagem de 2016. Fiquei hospedado na sua roça, a de Monte Forte, que ele modificou para receber viajantes. Depois de ler os comentários deixados na Internet por anteriores hóspedes ia pronto a ouvir as deliciosas estórias do anfitrião, e não fiquei desapontado.

Logo à chegada, sorriso fácil, gargalhada pronta, abraço amistoso. Mostra-nos o local, senta-se connosco enquanto bebemos a cerveja nacional gelada que nos serve. E logo nos vai contando o seu percurso. Nascido em São Tomé cidade, bem no centro, começa a trabalhar na área comercial, mas cedo se sente atraído pela sua vocação de agricultor. É verdade que ao longo da vida regressou, mais como investidor, às actividades comerciais: teve uma farmácia, uma empresa de importação e exportação, uma produtora de sabão, um barco de pesca, uma padaria. E mais, que a memória deixou ficar.

Mas é de facto a cultura da terra que chama por ele. Faz o percurso desde o nível mais baixo. Inicialmente paga aos homens mais experientes para que lhe ensinem o saber da terra. Torna-se assalariado e é promovido até chegar a feitor, uma posição quase única para um homem de cor naqueles tempos. Se bem me lembro, o patrão da roça Santa Catarina chamava-se Anselmo Neves, e foi ele que investiu o nosso amigo Jerónimo nessa importante posição, para choque dos restantes feitores, brancos.

Foi nessa posição, alta na hierarquia de uma roça (proprietário – administrador – feitor), que trabalhou também na de Ponta Figo. Depois veio a independência e pouco depois chegou-lhe a notícia de que o Governo, depois de ter nacionalizado todas as propriedades, estava a dá-las para gestão de quem se candidatasse e soubesse. O seu amigo, pai do actual gestor João Carlos (o tal de Na Roça com os Tachos, homem forte da cultura nacional e da roça de São João dos Angolares) ficou com a de São João e ele ficou na gestão da de Monte Forte, onde se encontra até hoje.

Chegou a ser deputado da Nação, mas agora encontra refúgio na calmaria da sua roça. É um homem de acção. O seu filho Carlos trata do marketing e das vendas e ele, no local, assegura-se de que tudo está em ordem para receber os clientes.

Tem 78 anos, e transporta ao colo, orgulhoso, o seu rebento mais recente, que ele considera o derradeiro: uma bonita menina de uns dois anos.

Foi um prazer conhecer o senhor Jerónimo e ouvir as suas estórias. O homem é uma enciclopédia andante da história das ilhas e do estilo de vida passado, que a nós nos diz algo. Mais uma daquelas pessoas do mundo que dão uma razão de ser às viagens que se fazem.

4 COMENTÁRIOS

  1. Olá Ricardo:

    As suas crónicas de vivências, das suas viagens, são sempre interessantes de ler,mais quando se trata da recente viagem a São Tomé . Quando íamos às Neves em passeio de automóvel, gostava de passar pelo pequeno túnel que há na estrada…

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