Dakar é daquelas cidades que, na óptica do viajante, parecem ser enormes carregadores de bateria. Sinceramente, é um local sem grande piada. Sim, eu sei. Há sempre uma forma interessante de abordar qualquer sítio, mas esta relativamente grande cidade esgota-se rapidamente. Contudo, é ideal para recuperar das canseiras da estrada, das aventuras vividas noutras paragens, da tensão sentida, dos mau-tratos infligidos ao corpo. Especialmente, como foi o meu caso, ficando-se numa zona considerada privilegiada.

Este foi o primeiro dia que passei por ali, entre Almédies e N’Gor. Próxima do antigo aeroporto (antigo agora, que na altura não era, mas a isso volto mais tarde) e do Março é uma zona feia mas agradável. Quanto à fealdade, nada a fazer, parece ser obrigatória em Dakar, onde as melhores casas, as melhores ruas, os melhores bairros têm um aspecto-cão. Fica o estilo de vida doce que ali se tem, num oásis africano, onde há total segurança, comércio, cafés, restaurantes, padarias.

Depois de duas semanas mais ou menos itinerantes e com condições de vida menos confortáveis, este foi um dia dedicada à doce arte de não fazer nada. Que bem que soube acordar numa cama só minha, num quarto sem mais ninguém e poder tomar um duche de água quente, ainda para mais com uma pressão fabulosa. Até uma secretária havia nos meus aposentos!

Passado um bocado o Thomas veio-me chamar para tomar o pequeno-almoço. Naquela casa é costume comer-se pela manhã em conjunto e é um hábito tão bonito! Havia baguetes frescas em cima da mesa, doces, queijos, Nutella, chá, mel… bolachas, eu sei lá, tanta coisa. Obrigado George!

Depois veio a conversa, sempre interessante com aqueles dois. Thomas & George. Política, viagens, o mundo. Como sentia falta de conversar! Bem, mas o nosso anfitrião tinha que trabalhar e o outro viajante estava atarefado a resolver uma série de problemas operacionais… tinha uma bicicleta para reparar e vender, bilhetes de barco para comprar. Ia para Zinguinchor, de onde eu tinha vindo.

Fiquei entregue a mim próprio, de volta ao meu sossego, em mais um dia de sol. Em mais de um mês em África acho que todos os dias foram assim… de sol, mais quentes no início e bastante moderados para o fim, até com algum frio quando a noite se aproximava.

Acabei por ir até à praia que fica ali tão perto. Voltei mais vezes, muitas mais. Mas neste primeiro dia em cheio em Dakar caminhei pelo areal, observei as pessoas. Havia uns quantos a pescar, com uma simples linha. Meninos jogavam à bola, e mais à frente graúdos também. As habitações são mesmo ali, encostadas.  Há ovelhas que se passeiam, habitantes que tomam banho higiénico no Março, com sabonete e muda de roupa. Os barcos estão ali, um pouco recuados, para não irem com a Marçoé.

Do outro lado há uma ilha. A ilha de N’Gorr. É pequena e há uma embarcação que assegura a ligação com a terra. A passagem custa 1.000 CFA, 1,50 Euros, para a ida e volta. Neste dia não fui. Deixei para mais tarde, acabei por visitar mesmo ao cair do pano, antes de voar de regresso a Portugal.

Sentei-me numa esplanada de praia, encomendei uma Gazelle e depois outra. Senti-me bem, descansado, confortado, com tanto para observar e com um conforto tão doce. Li um bocado, vi os homens mais velhos acompanhados por um outro tipo de “Gazelles”, falei com uma miríade de vendedores de tudo que orbitam em redor destes locais frequentados pelos europeus.

Voltei a casa, depois de passar pelo supermercado. Foi um fim de dia sereno, com mais conversas interessantes com o Thomas e com o George.

No segundo dia em Dakar repetiu-se o padrão de não fazer nada, interrompido por um passeio até à Ponta de Almédies, que é o ponto mais ocidental do continente africano. Bem, a ponta em si é inacessível, porque o Club Med tomou conta dela o que pessoalmente acho um pouco ultrajante. Penso que um ponto com aquela importância geográfica devia sempre ser mantido público, mas quem sou eu…

Na outra “ponta”, onde as pessoas comuns podem ir, encontra-se um aglomerado de restaurantes, assim tipo tascas, que são muito agradáveis, mesmo sobre o mar, oferecendo uma localização ideal para passar os últimos instantes de uma tarde. Na outra face da ponta, junto à chamada Route des Almédies, existem outros restaurantes, mais requintados e também com outros preços, que são uma boa opção. Mas o meu coração ficou naqueles finais de tarde (não, não foi o único) com uma Gazelle fresquinha na mesa, a observar todas as actividades envolventes, sentindo o cheiro do mar enquanto o sol descia no horizonte.

As mesas e cadeiras estão assentes numa plataforma com piso de areia, o que acho um toque muito agradável. Os preços da comida são bastante acessíveis – os da cerveja nem por isso – mas nunca experimentei as iguarias locais. Comida do mar não é a minha onda e ali é mesmo o que vale a pena.

Na volta, tal como na ida, uma pequena caminhada. Há um Tata (um dos sistemas de transportes públicos de Dakar, muito barato e muito simples de usar, mas também muito congestionado à hora de ponta), o 47, que faz uma parte da Route des Almédies, mas fica a meio. É um passeio agradável, descontraído, cuja memória é doce. Nesta área da cidade há mesmo vibes muito positivos no ar.

Depois, uma paragem no supermercado Casino, uma espécie de Modelo ou Pingo Doce, com preços um pouco altos mas com todos os produtos a que estamos habituados. Um pequeno luxo nesta viagem por África. E mais uma noite. Nunca dormi bem em Dakar, primeiro, por causa do calor, cortado pela ventoinha, que é ruidosa e nunca é boa para o sono. Depois, pelo enxame de mosquitos, muitos, que até com repelente picavam.

 

 

 

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