Estas são as cidades em que me imagino passar um tempo prolongado. As melhores cidades para viver no mundo para mim. Não para sempre. Em alguns casos por alguns anos. Noutros, uns quantos meses. Locais onde me senti muito bem como visitante e onde penso que me sentiria igualmente bem numa estadia a que se poderia chamar de “viver lá”.

Para cada uma indicarei as vantagens e atrativos mas também os senões da bela. Segundo uma perspectiva pessoal, a minha, formada pelos estímulos recebidos aquando das passagens como viajante.

Praga, República Checa

Praga é a capital da República Checa, localizando-se bem no coração da Europa. É uma cidade histórica, sendo o seu centro considerado Património Mundial da Humanidade pela UNESCO.

Porquê Viver em Praga?

É uma das cidades mais bonitas do mundo. O seu centro histórico é um autêntico museu e o rico passado de Praga está presente em todo o lado.

A vida cultural é fervilhante. Todos os dias há dezenas ou mesmo centenas de coisas a acontecer. Há mais de uma dúzia de clubes de jazz, cinemas focados nas produções independentes e nos filmes checos que podem ser vistos com legendas em inglês. A criatividade é omnipresente.

É cosmopolita, com esplanadas, beer gardens e uma vida de café incrível, com destaque para uns quantos estabelecimentos bem clássicos.

A sua localização central permite viajar imenso a partir de Praga. No próprio país pode-se usufruir da organização impecável da rede de transportes públicos e sair para passeios de dia inteiro na natureza e visitar locais históricos.

As escapadelas de fim-de-semana, são feitas facilmente por terra, a Viena, Bratislava, Wroclaw, Cracóvia, Berlim, Dresden e muitas outras cidades alemãs. Por via aérea voa-se com facilidade para qualquer país europeu.

É fácil e relativamente económico ir e vir desde Portugal, podendo-se escolher entre voos directos e ligações em diversos aeroportos que, sendo operadas por empresas low-cost, podem reduzir o valor da viagem.

Deste grupo de cidades é a única onde vivi, durante três anos com algumas interrupções. Na realidade Praga é uma das paixões de toda uma vida. Raro é o dia em que de uma forma ou de outra não penso em Praga. E criei o Visitar Praga, para ajudar os visitantes a descobrir a cidade para além dos óbvios roteiros turísticos.

Contudo…

As pessoas têm fama de antipáticas. Há diversas razões que o podem justificar. E tenho as minhas teorias: na cidade, o excesso de turismo e o comportamento de muitos deles já há algum tempo que vai perturbando os habitantes de Praga. E depois, historicamente os estrangeiros têm agredido, governado e explorado a Boémia e penso que essa continuidade pode ter criado uma animosidade endémica entre uma boa parte dos checos. Apesar de tudo esta característica colectiva tem vindo a atenuar-se nos últimos anos.

O clima pode ser duro. Dias de verão chuvosos e invernos longos e muito cinzentos.  Dantes a neve ainda trazia um toque de romantismo à época mas ultimamente as suas aparições têm sido discretas.

Praga tornou-se uma daquelas cidades flageladas pelo excesso de turismo e isso pode afectar a qualidade de vida de quem por lá se mantém e certamente fez subir os preços. O imobiliário é especialmente caro.

Buenos Aires, Argentina

A enorme capital argentina é uma cidade única, combinando o sabor sul-americano com o classicismo europeu.

Porquê Viver em Buenos Aires?

Porque se trata de uma cidade fascinante, com um vasto centro histórico que se baseia ainda na planta geométrica criada pelos fundadores há mais de 500 anos. Ali a animação é constante. E apesar de vasto o centro histórico pode ser percorrido a pé por quem aprecie caminhar.

Tem uma vida cultural fervilhante, bons cafés, bons restaurantes, espírito de bairro, personalidade e muita história. Combina modernidade com tradição, tem ambientes para todos os gostos.

A sua rede de transportes públicos é exemplar. Entre autocarros e metro vai-se a qualquer lado e quando é necessário a Uber funciona bem a preços insignificantes. Em muitos casos um serviço Uber custa o mesmo que em Lisboa vale um bilhete de metro.

Os preços são excelentes. Infelizmente para os argentinos a moeda nacional sofre cronicamente de uma desvalorização arrasadora, o que é terrível para eles mas excelente para os visitantes estrangeiros. Os preços de tudo são muito baixos, é uma cidade baratíssima para nós.

O comércio é louco: com tanta gente a viver na área metropolitana de Buenos Aires, há nichos de mercado para tudo, a oferta é infinita e, como disse, os preços são fabulosos. Qualquer coisa que seja necessária pode ser comprada em Buenos Aires. Tem livrarias deslumbrantes, uma actividade editorial muito rica.

Sendo a língua falada o espanhol, a barreira linguística é virtualmente inexistente, uma benção enquanto residente num país estrangeiro.

É uma base excelente para explorar a Argentina e uma boa parte da América do Sul. E muito há a ver por aquelas paragens.

Tem fama de ser insegura, mas não o é mais do que qualquer outra grande cidade em qualquer parte do mundo.

Contudo…

Fica do outro lado do Atlântico. As viagens para a Europa ou outros continentes são dispendiosas e longas.

Istanbul, Turquia

A cidade mais importante da Turquia – que contudo não é a capital, esta é Ankara – tem fama de ser ponto de encontro entre dois mundos, entre o Ocidente e o Oriente, entra a Europa e a Ásia. É uma mega-cidade, tendo mais de 15 milhões de habitantes.

 

Porquê Viver em Istambul?

É fascinante, desperta o nosso imaginário em todas as frentes. É a cidade mistério de Agatha Christie e do seu “Mistério no Expresso do Oriente”. Nas suas ruas podemos mergulhar na magia dos bazares do oriente e em poucos minutos caminhar por ruas europeias. A presença da água do Bósforo é dominante. Muitos passeios ribeirinhos.

A comida é excelente, os preços baixos. É uma cidade cheia de vida, na conta certa. Apesar de ter mais habitantes do que Portugal, não existe um sufoco, foi crescendo e estabelecendo “pequenas” cidades dentro da cidade. Tem uma boa rede de transportes públicos, é simples uma pessoa movimentar-se de um lado para o outro.

Istambul tem uma posição bastante central no mundo e tem excelentes ligações por via aérea. Deve ser dos pontos geograficamente mais centrais do mundo. De onde mais é que em mais ou menos quatros horas se está em Portugal, ou na Etiópia, ou no Omã, ou na Índia…?

E depois, Istambul é o centro funcional da Turquia, e a Turquia está recheada de maravilhas históricas e naturais. Desde a cidade pode-se explorar todo o país, num livro de capítulos sem fim.

Contudo…

A situação política na Turquia é tradicionalmente instável, mas se não se investir na aquisição de imóvel não deverá mesmo assim ser um problema. Não há muitos inconvenientes que me ocorram para uma vida em Istambul. Pode não ser para todos, mas se as coisas começarem a resvalar para o lado negativo, é só colocar um ponto final na aventura e partir.

Sarajevo, Bósnia e Herzegovina

A capital da Bósnia-Herzegovina não é dos locais mais comuns nestas listas de cidades para viver. Tal como Istambul é um ponto de encontro entre culturas.

Porquê Viver em Sarajevo?

Nesta pequena cidade o encontro entre Oriente e Ocidente foi tornado mais complexo pela convergência histórica de três impérios: o Russo, o Otomano e o Austro-Húngaro. O que significa, noutra perspectiva, a convivência (ou não) de três religiões. Tudo isto tem causado muitos problemas ao longo dos tempos mas traz um sabor único a Sarajevo.

É das capitais menos turísticas da Europa, especialmente quando se sai do núcleo histórico. E uma excelente base para explorar o país, muito genuino, rico em património histórico e natural.

Para os mais velhos, que como eu têm memórias das notícias sobre a guerra na ex-Jugoslávia, viver aqui tem algo de fascinante, numa vertente sombria. Haverá tempo para observar detalhadamente a evolução (ou estagnação) da situação desde esses violentos anos 90. Ler, ler muito, e ver, de olhos bem abertos. Visitar pontos guardados na nossa memória desses dias negros.

E gosto da comida e dos preços.

Contudo…

É uma cidade pequena e pode esgotar-se com alguma facilidade. Não se passa muito por aqui, não tem aquele toque de urbano infindável. Não é especialmente fácil encontrar-se bom alojamento de longa duração, especialmente se não estiver à vontade com a língua.

Pangim, Goa

Pangim era a capital do Estado Português da Índia e actualmente é capital do Estado de Goa, parte da Índia. É uma cidade relativamente pequena e muito encantadora, onde se pode mergulhar nas memórias do Portugal que se estendia por todos os continentes do planeta.

Porquê Viver em Pangim?

Adoro Pangim. Isso não quer dizer que toda a gente goste da cidade. Certamente muitos não lhe encontrarão nenhum atractivo. Mas, lá está, isso aplica-se a qualquer cidade. A qualquer escolha ou selecção. Agora tenho um problema: é que não me é fácil explicar porque é que Pangim me atrai tanto. Mas vou tentar…

Primeiro, os anos passaram por mim, quase não dei por eles. Mas hoje olho em volta e é normal ser o mais velho. O mais velho num grupo de amigos, um dos mais velhos bloggers de viagem. O que significa que a pessoa que sou foi impressionada por uma série de inputs que são alheios ao universo cada vez maior de gente mais nova que me rodeia. Uma das influências mais marcantes foi ter vivido o Estado Novo e a realidade do Império Ultramarino. Isso encheu o meu imaginário, ávido de referências como o é o de qualquer criança, de imagens de uma portugalidade distante. A existência de um mundo português é uma memória romântica. Para mim.

E Pangim é um exemplo acabado desse mundo. Na capital de Goa encontro uma fusão entre a Índia e Portugal. Adoro passear pelos bairros mais antigos e ver aquelas casas tão portuguesas mas com um tempero indiano. Sentir o calor húmido na pele, entrar num restaurante e ver português escrito e, muitas vezes, falado. Sinto ganas de abraçar este momento único, o da morte anunciada da nossa língua em Goa, mantida pelas derradeiras gerações.

Há algo de muito especial em assistir a um espectáculo de fado cantado por pessoas de feições tão diferentes mas com uma cultura tão próxima da minha. Gosto da atmosfera de pequena cidade provincial, onde quase toda a gente se parece conhecer. E adoro explorar Goa a partir de Pangim. Um lugar onde cada dia se pode ir a um sítio diferente e descobrir praias e fortalezas, aldeias e mansões rurais.

Acho lindo o carinho que a comunidade católica, ainda muito ligada a Portugal, nos oferece, a nós, portugueses. De uma forma geral as pessoas são amáveis (excepção feita para os condutores de autocarros).

Os preços são baixos, a magia é elevada. Comida maravilhosa, resultante da fusão da tradição gastronómica portuguesa e da cozinha indiana. E muitas viagens no interior da Índia e aos países que lhe estão próximos ficam em aberto, uma vez que se tenha uma base em Pangim.

E contudo…

O clima pode ser inclemente. As chuvas na época de grande pluviosidade, o calor, os mosquitos. A tristeza de ver perder-se aos poucos tudo o que é ou foi português. A distância em relação ao nosso país. E apesar de possível, não é assim tão fácil viajar até outros países daquela parte do mundo.

 

Baku, Azerbeijão

A capital do Azerbaijão é uma cidade completa, agradável, com muita animação e um notável equilíbrio entre modernidade e traços de outros tempos.

Porquê Viver em Baku?

É o ambiente. Aquelas avenidas cheias de vida, as ruas pedestres, a proximidade da água. Há uma mistura de ingredientes que resulta numa receita enigmática, exótica. Estamos ali rodeados de uma cultura próxima da turca, mas diferente. Muçulmana, mas muito moderada. Na realidade o país muçulmano onde a religião é levada menos a sério de todos – e já são alguns – por onde passei.

Em Baku não falta nada. Eventos culturais, comércio específico, bons restaurantes, bem dotados supermercados, uma vida nocturna fervilhante.

O mar beija a cidade e isso oferece-lhe um charme adicional. Os miradouros com vista para o mar Cáspio são encantadores e podem-se passar tardes sem fim a sorver café ou chá e a apreciar o panorama.

A modernidade e a antiguidade andam de mãos juntas, apesar de se sentir que se está a destruir demasiada da história urbana de Baku para criar zonas renovadas. É mesmo assim comum encontrar recantos que parecem parados no tempo. É eternecedor ver um prato com limões pousados num vão de janela, para quem os quiser comprar deixar uma moeda à confiança. Entrar numa mesquita deserta e partilhar o momento com o único fiel que reza do outro lado da sala.

O metro funciona bem. A rede podia ser mais extensa, mas mesmo assim é uma forma simples e barata para nos deslocarmos na cidade. E é fácil partir para escapadelas no país, explorando um Azarbeijão diferente, rural.

O dinheiro do petróleo trouxe benefícios à cidade, como sofisticados museus, fontes que adornam as ruas e o actual orgulho de Baku, o centro cultural Heydar Aliyev, um edifício único, espectacular, grandioso. 

 

Contudo…

O acesso ao Azerbeijão não é dos mais simples. O Cáucaso já é um pouco complicado e Baku fica especialmente afastado, de tal forma que quando andei pela região a primeira vez – em 2010 – ponderei visitar o país e a cidade mas acabei por desistir. E depois, aquelas viagens regionais que apetece fazer quando se está a viver num país estrangeiro, ficam também difíceis. Ir onde? À Geórgia? As opções não são muitas.

A cidadela de Baku, classificada como Património Mundial da Humanidade pela UNESCO é um local atroz, cheio de turismo descarado, transformado num centro comercial de lojas de recordações e restaurantes artificiais, cheio de carros estacionados por todo o lado. Detestei.

Outras ideias…

Argel, pela facilidade, pela proximidade, pelo ambiente descontraído, pelos preços baixos, pela possibilidade de a partir de lá explorar esse país maravilhoso para viajar que é a Argélia. Mas talvez não seja fácil obter as necessárias permissões e vencer os obstáculos do dia a dia.

Havana, se não fosse a quase impossibilidade de obter permissão das autoridades para lá viver. Gente boa, sem barreiras linguisticas. Um local único, fruto de uma fusão incrível de culturas e de etnias. Respira-se história e é uma boa base para explorar um país fascinante.

Lviv, na Ucrânia, próxima da fronteira com a Polónia. Uma cidade-museu, com beleza arquitectónica a cada canto, uma espécie de memória do que terá sido Praga nos anos 90. Pode ser polémico mas é assim que imagino as coisas. Infelizmente, em termos europeus, fica um bocado fora de mão, especialmente para nós.

Tóquio, enorme, exótica, distante. Com tanto para ver e explorar, uma cidade rica, quase inesgotável. Apesar da destruição causada pelos bombardeamentos norte-americanos na Segunda Guerra Mundial ainda restam alguns lugares históricos. De Tóquio pode-se partir à descoberta do Japão, dos seus lugares sagrados, das magníficas paisagens naturais. Só é pena ser tão longe e não ter os preços baixos das outras opções sugeridas neste artigo.

2 COMENTÁRIOS

  1. Excelente artigo que nos faz pensar sobre viver fora. Nessas cidades listadas, já morei meio ano em Istambul e meio ano em Lviv. Locais fantásticos e que me deixaram boas memórias. Abraço de Ouarzazate, Marrocos.

  2. Artigo muito bom. Conheço alguns locais e cidades aqui descritos, como Cuba e Buenos Aires e Pangim-Goa. Tenho boas recordações principalmente de Cuba. Um abraço

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