Mais coisa menos coisa faz um ano. Não sei exactamente quando escrevi umas linhas para o blogue, sei que foi quando as coisas começaram a abrir depois da primeira vaga do COVID-19, umas notícias sobre novas condições de vista para vários países, umas quantas notícias sobre a pandemia na perspectiva do viajante. E depois veio a segunda vaga e desisti. Até hoje.

Depois de mais de um ano sem sair de Portugal, fiz duas viagens de seguida. A primeira foi de quase uma semana, para aquecer, e limitou-se a Veneza. Logo depois, outra semana, desta vez na Suíça mas com o foco no Liechtenstein, um dos três países europeus que ainda não tinha visitado e que estava na mira há muito tempo.

Decisão tomada há algumas semanas atrás, quando me passou pela vista uma promoção EasyJet que propunha ida e volta de Faro para Zurique por cerca de 60 Euros. Irrecusável.

Muito trabalho me deu encontrar anfitriões Couchsurfing para todos os dias da viagem. Foi uma das viagens com maior taxa de recusas. Precisamente 49 pedidos. 34 recusas. 11 que ficaram sem resposta. 4 gloriosas respostas positivas. E uma noite passada num encantador hotel de montanha no Liechtenstein.

Partida de Faro ao final da tarde para chegar a Zurique antes da hora de jantar. Um eléctrico e uma caminhada de 1,7 km para chegar a casa do primeiro anfitrião. Já estava desabituado destas coisas. É de noite, um país relativamente novo para mim. Temperatura fresca, agradável, uma variação bem-vinda depois de seis meses de verão quente.

Chego, o Raphael recebe-me. Bato no gelo, quero-o quebrar, mas isso não vai acontecer totalmente, nem neste dia nem no outro, cuja noite também passei nesta casa, a meio das andanças helvéticas.

Vimos um jogo de futebol. É jornada de selecções, joga a Alemanha. Bebemos um vinho com sabor a frutos silvestres. Assim se passa o serão. No dia seguinte pela manhã parto para Luzern, sem um plano bem definido. Naquela altura só sabia que deveria ficar em Zug para segunda noite. Zug, não muito longe de Luzern.

Dormi bem, levantei-me relativamente cedo. Fiquei um bocado na casa depois do Raphael sair. Lá fora o dia cinzento não me convidava. E fui-me deixando ficar. Acabei por sair, bilhete de comboio para Luzern comprado na excelente app da SBB, a companhia de caminhos de ferro da Suíça. De resto, esta app foi uma companheira diária ao longo destes sete dias. A toda a hora a consultei, fiz compras, a usei para planear as voltas. Práctica, funcional, simples de usar. Indispensável. E serve também para o Liechtenstein.

Os quase dois quilómetros no sentido inverso. Manhã agradavelmente fresca. O comboio que chega com a precisão suíça, cheio, é dia de trabalho e hora de ponta. Expressões sonolentas, pessoas que prefeririam estar noutro lugar qualquer, talvez em qualquer outro lugar.

A cinzenta Luzern

Na estação central mudo de plataforma, passo para o comboio que se dirige a Luzern. Não vão tão preenchido mas mesmo assim leva bastantes passageiros. Depois de uma primeira paragem consigo um lugar espaçoso, para três pessoas, e faço a viagem bem instalado.

Chegamos. A estação ferroviária é grande e cheia de actividade. Saio. Sinto-me desanimado. As primeiras impressões não são as melhores. Uma multidão sem fim. Há gente por todo o lado. A entrar e sair na estação, a rodopiar em seu redor. Trânsito. Grupos de turistas. Asiáticos. Locais. Dezenas de câmaras fotográficas que se elevam em meu redor. Não gosto.

Começo a caminhar e nada muda. Continuo cercado por um mar de gente. Encontro logo a ponte coberta que é imagem de marca da cidade e para piorar as coisas há uma feira – muito certinha, com produtos caros – que atrai ainda mais pessoas. Dou mais uma volta, espreito atrás de uma esquina. Para além de gente há carros.

Estive precisamente uma hora e trinta e cinco minutos em Luzern e arrepio-me com a ideia de que cheguei a planear ficar ali dois dias. E nesta altura estou com a moral em baixo. Começo a interrogar-me se foi boa ideia vir, se não deverei ir direito ao Liechtenstein, colocar a minha bandeirinha no mapa e antecipar o meu regresso a casa, mas não há um regresso opcional, não por valores realistas. Pois uma semana será.

Os telhados de Zug

Saco do telemóvel e compro passagem para Zug no próximo comboio. É uma viagem curta e assim que saio sinto-me serenado. Estou a gostar mais. Nunca tinha ouvido falar em Zug e contudo é sede de um cantão com o mesmo nome e trata-se da cidade com mais riqueza na Suíça, o que é um estatuto considerável.

Também aqui tenho que caminhar cerca de quilómetro e meio para chegar a casa do meu anfitrião, o que faço com gosto. Começa-se a desenhar um sorriso na minha face. Afinal, afinal, apenas talvez, venha a passar um bom bocado.

E quando chego as dúvidas dissipam-se. O Christopher é polaco mas vive em Zug com a esposa, suíça. E a empatia é imediata, como tantas vezes (mas não sempre) sucede no Couchsurfing.

Mostra-me a casa, uma casinha fofa, antiga, com alma, muito acolhedora. E vamos passear, dar uma volta por ali perto. Mais tarde encontraremos a Debora que está com um casal amigo da Alemanha. Acabamos a tarde a caminhar juntos na parte antiga de Zug, que é de resto onde eles vivem.

No interior de uma recatada igreja de Zug uma freira medita.

Ruas com muito charme e sem as multidões de Luzern. Um lago que banha a margem da cidade, um final de dia relaxante, gente que aprecia os derradeiros momentos de luz natural.

Passamos pelas vias mais emblemáticas, vamos ao topo da torre do relógio (é uma questão de pedir a chave no gabinete de turismo, mesmo ali ao lado). Dali a vista é deslumbrante. Uma experiência inesperada e muito bem vinda. Interesso-me pelos cúbiculos feitos de madeira que no passado foram celas de prisão.

Há um casamento. Um casamento diferente porque os noivos são bombeiros. Eles e os convidados ocupam boa parte de uma rua pedestre, bebericando copos de vinho servidos pelo pessoal do restaurante que ali se encontra. O carro dos felizardos não poderia ser mais adequado…

Um carro de noivos muito especial

Vamos para perto da água. Às tantas eles regressam a casa. Aproxima-se a hora do jantar, que aqui é bem cedo, pouco depois das cinco. Eu vou passear mais um pouco. Está-me a saber bem. O sol vai-se pondo e as nuvens já não têm aquele poder opressivo que senti em Luzerna. Aqui, são belas. Admitem alguns raios de luz que se despenham na superfície do lago.

Um homem jovem alimenta uma legião de patos e cisnes. Por detrás, um jorro de água que se eleva quase na vertical. Já vou ficando cansado, o frio começa a chegar e de resto esperam-me em casa para um jantar de amigos.

O serão é uma surpresa agradável. Um jantar delicioso em boa companhia, não só dos meus anfitriões mas também da Katy, uma jovem inglesa de origem romena que está a alugar-lhes um quarto por um mês, e de Marcin, um amigo polaco do Christopher com que ficarei na noite seguinte.

Boa comida, excelente conversa, as horas passam e assim acaba o primeiro dia a sério desta viagem por terras da Suíça e do Liechtenstein.

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