6 de Fevereiro de 2023

Tratámos de tomar o pequeno-almoço e do checkout e seguimos para a estrada principal que cruza o vale de Kathmandu. Em princípio qualquer autocarro que estivesse a rodar para leste serviria. O plano era sair em Banepa e ali apanhar a carreira para Panauti, uma divergência da via principal.

Correu bem. Sem espinhas. Autocarro para Banepa, sair, encontrar o ponto de paragem para Panauti, que estava assinalado nos meus mapas e de facto não demorou até estar a bordo da segunda viatura, desta vez para o destino final daquele dia.

São só 7 km, muito divertidos, a sentir o vibe local. A maioria dos passageiros são estudantes, que se distribuem por lugares ao longo do percurso.

Na chegada a Panauti não tinha ainda marcado nada para passar a noite. Na realidade não havia muitas opções. Talvez nenhumas. Tinha referenciado uma tal de Panauti Homestay mas estava desconfiado, não me parecia normal que depois de vários anos só tivesse duas reviews no Booking.

Então a ideia era ir até lá e avaliar a situação no local. Só que a meio caminho entre a paragem de autocarro e a casa de hóspedes comecei a sentir um desconforto em relação a Panauti… nem sei porquê… mas a fila interminável de camiões que seguiam carregados de pedra teve algo de perturbante. Não paravam, passavam com intervalos de uns 30 segundos, levantando nuvens de poeira e causando grande ruído. Senti ganas de ir embora, sei lá, voltar a Bhaktapur, qualquer coisa, mas não ali.

Tive que respirar fundo algumas vezes. Recuperei. Lá fomos à casa, via-se ao longe, quase isolada, era claramente aquela.

Lá chegados alguém nos mandou esperar um pouco, depois veio um senhor, o proprietário, mostrou-nos o quarto, deu-nos o preço, acho que era algo equivalente a 11 Euros, incluindo pequeno-almoço. O quarto era espaçoso e tinha duas janelas panorâmicas. Se tudo corresse mal, era um pouso seguro e confortável. Ficámos.

Descansámos um pouco, soube bem. O ambiente era calmo, a vista muito agradável e a cama confortável. Da janela viam-se campos de cultura, quintas, outros prédios como o nosso, uma mescla de tradicional com influência ocidental. Pessoas subiam a vereda que nos tinha levado até ali, a algum lado conduziria.

Saímos e parámos num velho templo, ali muito próximo, histórico, com muita personalidade. Depois seguimos para uma espécie de durbar, logo a seguir, atravessando o riacho de águas rápidas.

O lugar está vazio. Vejo um par de turistas nepaleses. E depois, como diria Carlos do Carmo, “um bando de pardais à solta” sai de uma casa antiga de paredes decoradas com finas pinturas. São jovens monges, que correm e brincam, apreciando um momento de liberdade infantil.


Do outro lado do rio – não  que atravessámos mas um outro, que envolve aquele pedaço de terra – há um templo e um grupo de homens queima algo. Por um momento pensei que fosse uma cremação. Mas não era.

Demorou muito a esgotar o local. Foi um daqueles momentos que fazem valer uma viagem. Apreciar a tranquilidade, observar os detalhes e as correrias dos meninos, ver os edifícios coevos e religiosos… demorou o seu tempo.

Dali vagueámos um pouco. Passámos por ruas residenciais, mas onde poucos traços de modernidade existem. A vida ali não deveria ser muito diferente há décadas atrás, talvez séculos.

Há pessoas que se sentam pausadamente à porta de suas casas em amena cavaqueira de vizinhos. Outras caminham, absortas, nas suas vidas. Uma mulher estende roupa numa das pontes pedonais que cruzam o riacho. Crianças regressam da escola.

Metemo-nos por ruelas mais estreitas, sombrias e frias. Ouvimos sons do quotidiano que atravessam janelas e paredes.

Encontramos algo que deverá ser o verdadeiro Durbar de Panauti. Teoricamente os estrangeiros deveriam pagar entrada mas está tudo aberto e ninguém à vista para cobrar. Exploramos o espaço, observando mais templos. A madeira talhada que os ornamenta tem ares de centenária. Sobre as entradas a atenção à decoração é ainda mais clara e, por alguma razão, as portas estão encimadas por enormes cornos.

Saímos por outra porta e os detalhes da vida local continuam deliciosos. Demasiados para serem aqui descritos.

Um homem chama-nos para nos mostrar um pátio com uma janela muito antiga. Ainda bem que nos acompanhou porque está ali um cão possesso pelo demónio com o qual ele sabe lidar.

Na praça, que terá sido o lugar mais afastado onde fomos, há uma pequena venda. Sentamo-nos no chão com uma bebida. O dono fala algum inglês, é simpático. Enquanto ali estamos chegam e vão vários clientes. Incluindo uma menina de uns quatro anos que faz o seu recado e paga com orgulho.

Iniciamos o caminho de regresso. Há agora mais crianças a regressar a casa depois de um dia de aulas. Nas ruas vemos animais. Uma cabra tenta comer o que a prende. Um galo passeia-se, todo ufano.

Encontramos outras ruas, sentindo a aldeia. Um dia fabuloso!

Chegamos a casa, descansamos. O sol já vai baixo. Ao longe vimos uma trupe de crianças que corre pela nossa vereda acima. Serão os meninos que saíram da escola e que, vivendo todos para aqueles lado, fazem o caminho juntos.

O anfitrião convida-nos para jantar. Mais um momento memorável, receber aquela dádiva, na forma de comida e calor humano. Conversar um pouco, saboreando uma refeição deliciosa. O senhor é professor. Ouvimos algumas das suas memórias, ideias sobre a situação do Nepal, as conversas que se esperariam.

A noite faz-se fria, mas com uma pilha de cobertores a aconchegar dorme-se bem.


 

 

 

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