Ainda com o corpo a viver numa outra hora qualquer acordar às seis da manhã  parece ser a coisa mais normal do mundo. A doña Patricia bem que se tinha rido da ideia de me ver levantar a essa hora mas não demorou muito a perceber, com grande espanto, que não se tratava de bazófia.

De forma que nem para o pequeno-almoço que se aprestava a preparar tive tempo. Tinha os olhos postos na longa viagem (bem, “longa”é relativo, mas sim, mais ou menos longa) até Jericó.

Caminhar até à estação de autocarros de Santa Fé. E como está tudo diferente desde que passei aqui. Era o localzinho mais morto que se pode imaginar. Lembro-me de ali chegar e estar tudo fechado e quando finalmente encontrei alguém, ser olhado como se fosse um animal raro. Hoje, assim que entrei no recinto vi logo três ou quatro carrinhas a carregar passageiros e um dos condutores, confirmando que o destino pretendido era Medellin, deu ordem de sentar lá à frente, no melhor lugar.

E não demorou muito até nos fazermos à estrada. Condução perfeita, apressada mas dentro de uma margem de segurança aceitável, e o percurso até à cidade fez-se sem incidentes. As obras de construção da auto-estrada entre Medellin e Santa Fé seguiam a todo o vapor, com um perfume português atestado pela maquinaria da Teixeira Duarte bem visivel. Será o final do charme de Santa Fé, já tão perdido em apenas uns poucos anos.


Pensava apanhar um Uber entre o Terminal Norte e o Terminal Sul, mas descobri umas “busetas” que faziam precisamente esse percurso por uma fracção do preço. As coisas estavam a correr bem até então, mas isso iria mudar. E foi quando chegou a minha vez de comprar bilhete para Jericó. Tinha acordado cedo, dispensado o pequeno-almoço e quase corrido para a estação de Santa Fé. Tudo para chegar o mais cedo possível a Jericó e aproveitar pelo menos a parte da tarde.

Mas não iria acontecer. Ali estava eu, às 9 da manhã, e uma funcionária a dizer-me que só existiam bilhetes disponíveis para o autocarro das 12:50.

Pois que seja. Foram umas horas de fazer nada no Terminal Sul. Ler, comer qualquer coisa e esticar as pernas de tempos a tempos.

A hora aproximava-se. Fui até à porta de embarque e lá apareceu ele o bus parra Jericó. Entrei, sentei-me. E em menos de nada logo apareceu alguém com um bilhete para o meu lugar. Afinal aquele não era meu. Era um que saía cinco minutos antes, uma espécie de reforço, creio, porque não se encontrava no horário.

Portanto, lá saí, levando as minhas coisas. Esperei, já com algum stress, porque o tempo passava e nada acontecia, mas por fim aconteceu. Veio o autocarro certo e iniciou-se a jornada. Em vez das cerca de 3 horas previstas demorou mais de 4 horas. Parte delas por estradas lindíssimas e com uma passagem por Fredonia, uma pequena cidade no cume de uma montanha, construída nos declives de ângulo acentuada. Interessante mas não bonita. Contudo, fascinante. Fiquei com alguma pena de não a poder explorar.

A última fase da viagem é um bocado surreal. Andamos por estradas de montanha, a mais de dois mil metros de altitude. E de repente descemos para um vale e entramos numa auto-estrada de quatro vias, novinha em folha. Para mais à frente a deixarmos e iniciarmos a subida final até Jericó, mais quase 20 km sempre para cima, até chegar à cota exacta de 2.000 m onde encontramos a cidade.

Primeiras impressões: bonita, com demasiado turismo doméstico e muitas subidas e descidas. O autocarro pára junto à praça central e dali até ao hostel Las Cometas é um instante.

Sobre o hostel, para quem venha para estes lados… um bocado beh, para mim. O pessoal um pouco juvenil, quem ali trabalha são voluntários que pouco sabem do que estão a fazer ou sobre a cidade e depois os detalhes, como a falta de fichas eléctricas no dormitório e outras coisas assim, menos bem e que facilmente poderiam passar a estar totalmente bem.

A praça central de Jericó e algo de extraordinário. Pensei, a brincar, que parece ser uma pequena El Ja Fnaa, tamanha é a dinâmica que ali reina. É ladeada por edifícios espectaculares, repletos de cor, e está ali também a catedral. E depois temos as lojas e cafés, que parecem sair de um filme americano, daqueles em que dois tipos passam a fronteira e vão a Tijuana fazer qualquer coisa. Não por ter mau aspecto, mas pelos caracteres, com sombreros e cavalos e muita música que na minha ignorância diria ser mexicana.

Passeamos pelas ruas da cidade. Cidade ou vila, ou aldeia. São entre 8 a 12 mil habitantes, dependendo de a quem se pergunta. Há duas escadarias consideráveis, uma com 80 e outra com 100 degraus. E as casas, só visto. Já tinha tido um contacto com esta cultura de capricho das fachadas, quase todas pintadas em cores vivas, impecáveis, chamativas, muito bem decoradas.

É um cenário que pede fotografias. Muitas. Entretanto cai a noite e o ambiente torna-se visualmente distinto. As cores perdem importância e são agora as pessoas que fazem a cidade. As esplanadas cheias, as luzes de natal que ainda ali estão, a embelezar a praça.

Chega a fome e encontramos todos os restaurados que tinha anotado como a “experimentar” e estão quase juntos, três deles na mesma rua. O escolhido foi o Isabel. Impressões divergentes. O meu naco de carne, cozinhada durante seis horas, estava delicioso mas basicamente frio. E não gostei nada que me perguntassem directamente se queria incluir a gorjeta na conta. Por acaso até ia dar, de vontade própria e a quantia que me apetecia. Assim, disse que sim, instintivamente, e pumba, 10%, o que aqui é completamente extraordinário. Além disso, acho que paguei mais, mesmo assim.

Mais umas voltas antes de regressar ao hostel. Estava cansado, dormi cedo, muito bem, ainda nem eram dez horas.

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