Dia 11 de Fevereiro de 2020, Terça-feira

Acordei relativamente cedo e tomei o pequeno-almoço incluído no preço. Aqui, 5 Euros dão mesmo para muita coisa.

Saiu para a rua. O céu apresenta um misto de azul e nuvens. Vou caminhar pela povoação. Tenho até umas coisas a tratar: comprar o bilhete para La Paz. Feito. Partida às 13:30. E agora, encontrar um SIM card boliviano para me servir nas próximas duas semanas. E não é que foi simples? Encontrei uma loja de telemóveis e o simpático proprietário e a sua esposa logo me instalaram o cartão que precisava. Internet já tenho! Aproveitei para comprar uns auriculares, que os que trouxe de Portugal começaram a fazer mau contacto.

Vou sentir a falta desta vista do meu quarto

Começa a chover quando saio do recinto da grande igreja que existe em Copacabana. Tenho o meu corta-vento impermeável e não deixo que a chuva estrague o passeio. Encontro uma rua que funciona como mercado. Fabuloso. Pitoresco. Muito genuíno e cheio de cor.

Entro numa mercearia para comprar uma bebida fresca mas o senhor era tão rude que saí. Acabo por encontrar um bar com um terraço com vista onde compro uma garrafa de Inca Kola, um refrigerante peruano a que, diguemos, me afeiçoei. Se puder descrever aquilo diria que tem um vago sabor a pastilha elástica, aquelas pastilhas elásticas da minha geração, sem um sabor para além daquele.

Já estou na Bolívia e sinto-me sortudo por ter encontrado aqui Inca Kola. Sei que será a última vez que beberei isto. E aprecio o momento, apanhando um pouco de solo no rooftop deserto que tenho só para mim.

Volto para a praia e vejo um tipo a subir uma ladeia com uma camisola da Selecção Nacional Portuguesa. Peço-lhe para tirar uma fotografia.

Agora vou para um longo passeio pela praia. O dia está muito agradável. O sol venceu a chuva e enche a paisagem de cor.

Vejo as pessoas – maioritariamente turistas ocidentais – embarcar para a Ilha do Sol e sinto uma certa inveja. Teria gostado de passar aqui mais tempo, mas não deu.

Vou andando, deliciando-me com a paisagem. Com as centenas de barquinhos, e os cisnes e patos a pedal que estão ali encostados, à espera de qualquer coisa que não vai acontecer hoje.

Há pontões simples, de madeira, que entram pelas águas cristalinas do lago. Caminho num, dá umas fotografias espectaculares.

Continuo a andar. Passo por um acampamento. Três ou quatro tendas. Um grupo de pessoal liberal local. Penso que bolivianos, mas certamente sul-americanos. Jovens. Quando passo, um deles cumprimenta-me.

Afasto-me mais, passo junto a um par de estátuas que representam caciques índios. São de uma dimensão considerável. Junto a elas um tipo fuma um charro.

A praia é mais longa do que parece. Ainda caminhei um bom bocado e mesmo assim não cheguei ao fim, mas sinto que é horas de começar a regressar.

Vou buscar a mochila ao hotel. Ainda é cedo para o autocarro. Sento-me um pouco no lobby a matar tempo. E continua a ser cedo. Vou andando então. Nas calmas. Compro umas sandes num café todo moderno, todo fino, para turista. Há muita gente que espera transporte. Quase todos estrangeiros. Primeiro vem um, que se destina a outras paragens.

 

O meu, para La Paz, estaciona do outro lado. Agora vou apanhar o autocarro. E continuo a sentir uma saudade por antecipação. Passei menos de 24 horas em Copacabana mas foi muito agradável e será um local a incluir em qualquer roteiro pela Bolívia. Apesar o do país ser tão rico em locais interessantes.

Será uma viagem curiosa, sempre em altitude, com paisagens magníficas. O lago Titicaca estará presente ao longo de quase todo o trajecto. Em determinado ponto, uma surpresa. Toda a gente terá que sair do autocarro pois atravessaremos uma superfície de água. Não há uma ponte para atalhar viagem mas existe uma barcaça que transporta os veículos, incluindo os pesados, e um pequeno barco que oferece travessia às pessoas.

Foi uma pausa bem-vinda e interessante. Compramos a passagem e seguimos para o barco, que vence a distância em poucos minutos. Chegados ao outro lado observamos a vinda do autocarro, que desembarca pouco depois.

Entretanto muitos dos passageiros aproveitaram para comprar um petisco nas barraquinhas que ali existem. Eu simplesmente estico as pernas e observo.

Em breve chegamos a La Paz. Parece ser uma cidade enorme e sem dúvida tem traços bizarros. Desenvolveu-se em terreno tão acidentado que da mesma forma que noutras urbes se construíram sistemas de metropolitano, aqui o transporte mais rápido e confortável faz-se através de um complexo sistema de teleféricos. Existem linhas com diversas cores, que se podem até cruzar, tal e qual sucede com o metro.

Mas não chegarei a usar nada disso, apesar de alguns percursos serem bem cénicos e considerados atracções turísticas. Acho que estou algo cansado e a altitude afecta-me. Não sinto dinâmica para experiências novas. Prefiro passar as poucas horas que tenho em La Paz sem problemas operacionais para resolver, simplesmente passeando a pé desde o meu alojamento.

Vou ficar perto do centro. A oferta hoteleira em La Paz é pobre. Não há muita oferta, pelo menos para o meu segmento de orçamento. Nada de hostéis atractivos. Escolho o que me parece menos mau e veio a ser isso… algo aceitável, bem localizado. Não correu mal. Apesar da estrada relativamente ruidosa o quarto era interior e à noite o movimento cessava por completo. Dormi bem ali.

Caminhei desde o terminal rodoviário. É uma cidade diferente. Índia. Não na índia, mas habitada por índios.


Ia um pouco a medo, sou sempre assim. País ou grande cidade nova, prudência em cima. Não sabia bem o que esperar. Há sempre aquela aura negativa que envolve as histórias das grandes cidades latino-americanas.

Lá vejo as gôndolas dos teleféricos, movendo-se pachorrentamente. Vejo padarias, padarias e tasquinhas e tomo nota mental que fome não passarei aqui. Há muitos locais para comer.

A cidade tem um ar pobre, de forma geral. Caótico, mas não tanto aquela confusão urbana, com muito trânsito e poluição mas mais aquela amálgama humana, como em Delhi. Não que as viaturas e as buzinadelas e o fumo negro dos escapes não agridam os nossos sentidos a toda a hora.

O centro histórico é uma mistura de estilos arquitectónicos. Há edifícios mais antigas, uns restaurados, outros num triste estado de envelhecimento. E mais modernos. Penso que me faz lembrar algumas partes de Lisboa nos anos 70.

Acabo por encontrar o alojamento que tenho reservado. Descanso um pouco. Pergunto onde se pode comer uma pizza, e sucede que mesmo ali em cima, à esquina, há uma pizzaria familiar, que será algo notável como veremos.

Para já, retemperadas as forças, vou ver um pouco do centro de La Paz. Já escrevi isto, mas tenho que me repetir: é uma cidade estranha, diferente, bizarra. E, de certa forma, fascinante. É enorme, mas o centro nem tanto.

Explorei as ruas envolventes, até chegar à via pedestre que é considerada a “rua do comércio”. Não é especialmente impressionante, mas lá cheia de vida é. Depois, encontrei a praça central e o mesmo se aplica. Para uma cidade com estas dimensões e com a significância histórica de La Paz, é uma mera praçeta.

Em seu redor encontram-se os edifícios mais importantes, incluindo o palácio presidencial. Tive a sorte de aparecer ali na hora em que se fazia o render da guarda. Interessante.

Andei um pouco mais pelas ruas ladeadas de prédios decrépitos, cheguei a um espaço com tanta e tão activa gente que parecia um vespeiro. É hora de ponta e a multidão engrossa. Pessoas de passo apressado dirigem-se a casa. Há vendedores de rua, uma pequena feira, muitas lojas com gente a entrar e a sair.

A noite começa a cair e é melhor começar a regressar a casa. Subo umas escadas, vou ter a uma rua cheia de movimento, com muitos autocarros a passar. Estes veículos podem ser poluentes como o raio mas são um espectáculo.

Chego. Agora vou comer. Procuro a pizzaria que é ao virar da esquina e encontro-a aberta. Tem uma só mesa e mesmo assim o espaço no interior é reduzido. De facto trata-se de um negócio familiar. Um menino de uns dez anos ajuda o pai a preparar as pizzas. A minha encomenda é aceite e começa a ganhar forma. O forno está ali mesmo, por detrás do balcão.

Poderá não ter sido a melhor pizza que comi na vida mas foi certamente a experiência mais interessante associada a uma pizza.

De barriguinha cheia preparo-me para dormir. Teoricamente reservei uma cama num quarto partilhado mas fico com ele só para mim. O serão foi ainda um pouco barulhento, quero pelo trânsito pontual na rua quer pelos trabalhos que o rapaz que trabalhava no estabelecimento decidiu fazer aquelas horas. Mas quando a hora de dormir chegou, reinava um silêncio imperturbável e dormi muito bem.

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