Yemen, oh Yemen! Tão desejado durante tanto tempo e vais finalmente acontecer. Como tantas outras coisas com um cantinho no meu imaginário o Yemen chegou através das aventuras de Tintim. É no álbum Carvão no Porão que o famoso repórter vai para aquelas bandas e desde esse longínquo dia de ano indeterminado dos anos 70 que persigo a oportunidade de seguir as pisadas do herói de Hergé.

A instabilidade na região e a impossibilidade legal de entrar no país (excluindo a ilha de Socotra, mas não é bem a mesma coisa) mantiveram-me afastado. Até agora. Recentemente tornou-se possível visitar uma parte do país. Há quem pense que este abrir de portas está ligado com o aumento da segurança. Não é bem assim. Há já algum tempo que a situação se encontra estabilizada.

A permissão de entrada de visitantes na província de Hadhramaut é apenas mais um rodopio no complexo xadrez político do Yemen. Uma decisão provincial que desafia o poder da Coligação (entre os Emirados Árabes Unidos e a Arábia Saudita) que interveio no país e travou o avanço das milícias Houthi e definiu até ver o mapa do Yemen. Como no passado o país encontra-se dividido entre os extremistas Houthi e o território controlado pela Coligação. Que se opõe à entrada de visitantes estrangeiros.

Portanto, eu e o meu amigo Gustavo fizemos uso dos serviços da Penguin que por seu lado revende os pacotes de viagem de uma empresa local e assim nos fizemos ao caminho. Bem, mas antes disso, uma semana no Egipto. Porque não, já que a única forma de entrar no Yemen, para nós, viajantes, é através do voo da Yemenia que liga o Cairo a Seyun? Assim sendo, já que tinha que ir até ao Egipto, fiquei uma semana.

Foi um revisitar de locais, uma oportunidade de dar um abraço aos meus bons amigos egípcios de longa data. Um par de dias no Cairo, depois um voo para Aswan, de volta à capital para apanhar o autocarro para Alexandria e uma última noite na grande cidade. No dia seguinte, de manhãzinha cedo um Uber levar-nos-ia ao aeroporto. Pelo menos esse era o plano.

Já me preparava para o aconchego da cama quando recebo no WhatsApp uma mensagem da agência local a avisar que o voo tinha sido adiado. Já não seria de manhã mas sim ao fim do dia. No fundo, boas notícias. Poderia dormir à vontade e ir para o aeroporto sem pressão. Seria um dia mais calmo.

À hora devida lá estávamos na fila para o checkin. Foi fácil identificar os quatro companheiros para esta tour. Duas ocidentais, mais um dinamarquês e um chinês. Só podia. Já estavam em grupo e pensaram o mesmo de nós e logo se apresentaram.

Parece que fui o único sortudo a ser avisado sobre o atraso. Vantagens de ser previdente. Há uns dias tinha estabelecido contacto WhatsApp com a empresa e assim também eu era o único contacto que eles tinham para avisar. Resultado: os outros estavam no aeroporto desde muito cedo. E nós ali, fresquinhos e cheios de energia.

Passamos o controle de segurança, a verificação de passaportes e já perto da porta de embarque reparo num tipo a olhar para nós. Fixamente. Bem, a coisa passou-se, não pensei mais nisso. Até que uns minutos mais tarde, quando já estávamos sentados à espera da chamada ele reaparece e mesmo ali apresenta-se. Afinal é o dono da empresa de tours que decidiu vir pessoalmente ao Cairo receber-nos para compensar o inconveniente do atraso do voo. Fabuloso!

Para fazer prova de identidade mostra-nos no seu telemóvel imagens dos nossos documentos. E a partir dali teremos este anjo protector a orientar tudo.

A bordo o tratamento é VIP. Veio a ceia e perguntam-nos se queremos repetir. Nunca tinha visto tal coisa num voo. O Abdul – este é o seu nome – anda para trás e para a frente, conversando com os elementos do grupo. O irmão é piloto da Yemenia, mas não daquele voo.

A viagem não é especialmente longa mas é cansativa. É mesmo a meio da noite, uma noite mal dormida. Chegamos, o bulício esperado, controle dos vistos, dos passaportes… está ali o Abdul para tratar de tudo, de mexer os seus contactos. Parece conhecer toda a gente. Dentro do possível é num instante que nos põe na rua, onde nos espera o guia que nos acompanhará nos próximos dias.

Confesso que ficámos um pouco decepcionados. Inebriados com a eficiência e simpatia do Abdul não nos caiu bem saber que afinal era o Jamal o guia, o nosso pai e mãe durante os dias de Yemen.

E afinal, digo já, não poderíamos ter um melhor guia. Em todos os aspectos.

 

 

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