Dia 13 de Fevereiro de 2020, Quarta-feira

É difícil escrever o diário de um dia em Sucre. Especialmente do primeiro dia. Há tanto para ver e fazer que uma narrativa detalhada seria um texto sem fim, em encadeado de observações de edifícios históricos, ruas cheias de charme, mercados, locais, pessoas. Terá que ser resumido, e de que maneira…!

Dormi bem naquele hostel. Acordei cheio de vontade de explorar mas antes teria o pequeno-almoço. Também ele é excelente. E neste primeiro dia tinha uma surpresa: figos frescos, algo que adoro e nunca pensei encontrar por aqui. Num outro dia comprei um saco na rua, a um velhote sentado no chão, mas não eram tão bons como os que me serviram no hostel. Todo o pequeno-almoço foi bom e variado, tomando com gosto antes de sair para a rua.

E agora, para onde me dirigir? Vou simplesmente deambular, seguir o vento ou o instinto, andar por essas ruas todas. Virei à esquerda. Revi a pequena igreja que serve o convento de Santa Teresa, ali mesmo ao pé, por onde tinha passado à chegada.

Voltei à praça principal, que no início da manhã tem um ambiente bem diferente, mais sério. As pessoas cruzam o jardim a caminho de qualquer coisa. Há algum trânsito. Mas Sucre nunca será o caos de tubos de escape e ruído das outras cidades sul-americanas que visitei.

Vejo as “zebras”, sobre as quais já tinha lido: jovens voluntários que vestem um fato de zebra e estão nas ruas divertindo e ajudando os cidadãos. Param o trânsito se um idoso precisar de atravessar, tiram selfies com os peões, mandam piadas, um passo de dança, fazem rir e semeiam a boa disposição. A ideia nasceu em Sucre e espalhou-se por outras cidades bolivianas e é algo bonito de se ver.

Observo os bonitos edifícios que ladeiam toda a praça, alguns dos quais nunca saberei o que são nem qual a história que trazem.


Agora vou andando em busca do parque Simon Bolivar, onde existe uma geocache que quero encontrar e que será a minha primeira na Bolívia.

Passo em frente ao Museu de Etnografia e espreito. Depois voltarei. Prossigo o passeio. Há uma zona universitária, com o campus instalado num bonito edifício de outra era. Em redor nota-se a natureza da zona pelo comércio existente: livrarias, lojas de fotocópias, cafés para estudar.

Dou com o mais bonito hospital que já vi, num antigo convento. Ali próximo há um parque urbano muito bem arranjado, com muitas flores e relva bem verde. Do outro lado, o teatro da cidade, num edifício clássico impecavelmente mantido e pintado com um branco tão limpo que ofusca.

O parque está já nas suas traseiras. O calor está a apertar. Logo à entrada há vendedores de sumo de laranja. Um posto de turismo que parece estar encerrado em definitivo. Uma fonte brota água e um par de mulheres recolhe alguma da água.

Vou andando pelo parque e é óptimo. Descubro um cantinho com um skate park e uma série de bonitos murais. Uma área de restauração, muito concorrida. Há uma zona grande do parque dedicada à criançada, com brinquedos dentro da temática dos dinossauros.

Encontro a geocache e com ela encontro mais pessoas que andavam à sua procura. Espectacular! Um casal, ela boliviana e ele norte-americano e duas senhoras alemãs. Quem diria, um encontro espontâneo de geocachers numa cache que está meses sem visitas.

Sento-me por ali um bocado a descansar e a ver as pessoas. As jardineiras trabalham. Há que manter o bonito jardim assim como está.

Caminhei até ao cemitério principal de Sucre. Ora se eu já gosto de visitar cemitérios, o de Sucre seria imperdível pois é considerado uma das atracções turísticas de uma cidade com tanto para oferecer. Ainda caminhei um par de quilómetros sob um sol inclemente e tudo isto para chegar lá e dar com um nariz nas grades. Um simpático segurança diz-me que está fechado e que reabre às 14 horas. Frustrante. São 12:10. Não vou esperar nem vou voltar neste dia. Vou regressar ao hostel para descansar um pouco.

Encantado. É como me sinto. Pela cidade, pelo hostel. Coisa boa, este instinto que tive de escolher Sucre para uns dias de pausa. Deixo-me estar por ali a ler um pouco, com aquela serenidade que vem de saber que tenho todo o tempo do mundo.

Às 14:00 voltei a sair. O sol continua aí. Até o astro-rei faz questão de marcar a diferença de Sucre. Depois de semanas a ver cinzento, nunca faltou a luz e a cor nesta cidade.

O primeiro objectivo da tarde é a Casa da Liberdade, uma antiga universidade jesuíta onde a 6 de Agosto de 1825 se anunciou a declaração de independência da Bolívia. A visita vale. Ao chegar estava a começar um tour guiado em inglês, onde me integrei. Foi interessante, talvez demasiado prolongado, a um certo ponto algo enfastiante, mas foi positivo. Quanto mais não fosse a arquitectura do edifício, que data do início do século XVII, é linda. E há aquele sentir da História que ali aconteceu. Como se imagina é um dos monumentos mais importantes do país.


Terminada a visita, compro um balde de gelado – e que bom e barato o é em Sucre – e regresso ao hostel para relaxar mais um pouco.

Para hoje tinha ainda outro objectivo: ir ver o pôr-do-sol a La Recoleta. É um alto próximo do centro da cidade onde existe um mosteiro. Vai-se bem a pé. Em termos de distância. Mas é sempre a subir e a altitude afecta o esforço. Vou andando, continuo deliciado com a cidade. É preciso ir com os olhos muito abertos porque a cada passo há uma nova perspectiva, uma nova maravilha.

Chego lá acima. A vista é boa, mas não tão deslumbrante assim. A cidade, vista ao longe, não é especialmente bonita. Mas o ambiente é fantástico. É claramente um dos pontos mais populares para os habitantes de Sucre. Ali perto há um liceu. A área está cheia de jovens estudantes de uniforme. E como é Carnaval o caos vai crescendo, com arremeso de ovos e sacos de água. Uma autêntica batalha carnavalesca que não deixa ninguém seguro.

Antes, contudo, tive tempo para apreciar a calmaria. Os casais de namorados vão até La Recoleta para apreciar um momento romântico. Alguns amigos fumam um charro. Aqui e ali um estrangeiro observa a paisagem.

Sob o miradouro existe a esplanada de um café com preços algo inflacionados. É um dos locais “finos” da cidade. Ali perto há um mercado de artesanato. O bairro chama-se San Lázaro.

Quando os balões de água começaram a cruzar os céus e um par ovos extraviados aterrou junto aos meus pés, decidi que seria melhor mudar de localização. Sentei-me no chão junto a uma parede, num canto da praça fronteira. Dali pude continuar a observar com um risco reduzido.

Passado um bocado os estudantes começaram a retirar, dirigindo-se a suas casas. O sol já foi dormir. Está na hora de iniciar o regresso a casa.

Passo por paragens de autocarro onde as viaturas passam completamente atulhadas. Parece que não cabe nem uma formiga mas os jovens encontram espaço para mais uns quantos.

Ao serão vou à praça principal, mas o ambiente está mais morno do que na véspera. Visito um supermercado que existe ali próximo. O único que consegui encontrar no centro histórico de Sucre. Agora tenho mantimentos para os próximos dias e sei onde voltar se precisar de reforços.

No hostel a lotação foi reduzida para metade. Só tenho dois companheiros de dormitório e no dia seguinte ficarei com o espaço todo por minha conta. O meu bem-estar em Sucre não pára de aumentar.

 

 

 

 

 

 

 

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