Dia 2 de Março de 2020, Domingo

Este foi um dia estranho. Começa pela manhã. Está um sol radioso. É Domingo, a cidade parece abandonada. Preparo-me para partir. Hoje pernoitarei em Villarica, uma cidade a meio caminho entre Asunción e a orla sul do país. Acabo de fechar a mochila, olho em redor, despeço-me deste hostel onde me senti tão bem. Chamo um Uber para me levar à estação de autocarros. Chega passado uns minutos e arrancamos.

Chegamos à estação, indicam-me onde encontro o autocarro para Villarica. Não demorará muito a partir. Vamos andando, por avenidas vazias, num velho veículo. De repente apercebo-me que não tenho meu Kindle comigo. E num flash passa-me pelos olhos a imagem da sua bolsa, colocada no chão, por detrás do beliche. Maravilha. Bem, levanto-me, falo com o condutor e o seu ajudante, explico-lhes a situação. Sem problema. Param o autocarro para eu sair. Abençoadas novas tecnologias. Tudo o que tenho a fazer é chamar outro Uber, regressar ao hostel, e voltar à estação de autocarros.

Espero mais um bocado e chega a minha viatura, conduzida por uma mulher mais ou menos da minha idade. Reservada e seca na conversa. Tudo bem. Vamos para o hostel. Felizmente que o sistema para entrar era através de um código introduzido num teclado junto à porta. Porque se fosse com chave tradicional, estava feito. É Domingo e ninguém do pessoal irá trabalhar neste dia.

Expliquei a situação à condutora, que espera na rua enquanto recolho o meu Kindle, que lá estava, exactamente onde o tinha visualizado. Saio tão depressa como entrei. Felizmente o esquecimento não me custará mais do que uns 3 Euros e uma hora de atraso.

De regresso à estação ela torna-se mais conversadora. Mais uma pessoa interessante ao volante de um Uber.

Re-apanho o autocarro para Villarica e desta vez sem problema. Uma viagem de algumas horas, interessante, como foram as que fiz pelo Paraguai. Adoro este país, tão diferente. Parece que é o país mais pobre da América do Sul, mas na verdade não consigo acreditar. Observei muito e se não tenho dúvidas que nas grandes cidades existirão áreas com condições de vida miseráveis, isso passa-se em qualquer grande cidade latino-americana. Tirando isso, no espaço rural e nas zonas mais centrais das cidades vi um país que não fica nada a dever a nenhum outro deste continente. Pronto, OK, talvez ao Uruguai… Chile… Argentina.

Pelo caminho compro dois pães salgados a uma vendedeira. Estes pães são muito populares. Vendem-se um pouco por todo o lado e toda a gente os compra como um petisco.

Hoje vou fazer Couchsurfing. Pela primeira e última vez nesta viagem pela América do Sul. Foi um processo complicado porque o meu anfitrião demorava a responder às mensagens, mas lá ficou acertado para nos encontrarmos em determinado café no centro de Villarica. Às 14:00.

Cheguei à pequena cidade, andei uma curta distância desde a estação até à praça principal, onde se encontra o tal café. Estava um pouco adiantado. Comprei uma Coca-cola e sentei-me numa das duas mesas exteriores. Vieram as 14:00 e foram-se. 14:15. 14:30. Já começo a ficar aborrecido. Contacto com o anfitrião. Tinha ido a um almoço de família e estava para sair. Mas não saiu. Ainda esperei mais uma hora, levantei-me e procurei um hotel.

Aproveitei para ver o que havia a ver ali no centro. Uma igreja, um par de praças ajardinadas, um palácio decadente com um muro adornado com bonitos murais. Não há assim muito mais.

Não havia nada com um preço dentro da minha gama usual. O mais barato eram 25 Euros. OK, seja. E no momento em que vou abrir a boca para dizer que sim, que fico com o quarto, o anfitrião liga-me. Que já chegou.

Fico a hesitar um pouco, mas pronto, vou tentar arrefecer o mau-humor e combinamos que ele passará à porta deste hotel para me recolher.

Vamos para casa dele, bebemos umas cervejas, conversamos um pouco, numa mistura curiosa de inglês, espanhol e português. Não tudo misturado. Uma frase ou uma série de frases em cada uma das línguas.

Ele vive numa vivenda catita perto do centro. Naquele dia haverá um jantar no clube de golfe de Villarica. Um jantar para um grupo de alemães, potenciais investidores. É uma cena algo estranha. Lá estou eu, com ele, a preparar o tal jantar. Sou convidado sombra, a carta fora do baralho.

O dia acaba e a noite começa ali. Falamos com o pessoal que vai grelhar a carne. O meu anfitrião conhece toda a gente. É médico e, surpresa das surpresas, é presidente do clube de futebol local que não é qualquer um: o Guairena nasceu há um par de anos, reunindo uma série de clubes menores da região, e no dia anterior tinha batido o Guarani, eterno candidato ao campeonato paraguaio, um dos dois grandes do país.

Chegam os alemães, enfatuados, e o jantar é servido. Não me apetece nada estar ali com um bando de arrogantes mas é o que é. Uma experiência diferente. Servido o jantar o anfitrião faz uma apresentação sobre o projecto Guairena, vende umas camisolas da equipa, angaria fundos.

Levo umas picadas de mosquito nos tornozelos o que não me agrada especialmente porque há um surto de dengue enorme no Paraguai e especialmente na zona de Villarica.

E é assim. Terminado o jantar vamos comprar qualquer coisa para levar para casa, um hamburguer no McDonalds para a mulher dele. Comemos dois Sundaes. E pronto. Instalo-me no sofá da casa. No dia seguinte já não o verei, ele sai mais cedo, eu acordarei para seguir viagem.

 

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